“Cy commence le viandier Taillevent, maistre
queux du Roy de France, ouquel sont
contenues les choses qui s’ensuivent:
Et premièrement:
Pour dessaler toutes manières de potaiges.
Pour oster l’arsure des potaiges que l’en dit aours.
Bousture de grosse chair. Turbot
Hericoc de mouton; boully lardé”.
(Le Viandier de Taillevent, século 15)
Pelo trecho acima, mesmo em ortografia arcaica, dá pra perceber a quanto tempo o turbot faz parte da cozinha francesa. Em Portugal, é conhecido como ‘pregado’, nome rústico, que não faz jus à delicadeza desta espécie avantajada de linguado – esse da foto é maior do que dois braços abertos. É peixe de águas frias, de carne firme, que responde tão bem à grelha fina quanto ao preparo no vapor. Ou no sous-vide, como fez o Joel Robuchon, para combiná-lo com um molho quase pizzaiolo.
Aqui no Brasil, chegou mesmo com a denominação francesa – meio tímido, mesmo com todas as credenciais, importado das primeiras experiências das fazendas marinhas do Chile, para essa espécie. Era caro, mas destoava na textura. Destoa, aliás, sustentando molhos como os de cogumelos selvagens, de Alex Silva, no antigo Bocca, em Lisboa – ou os de Alain Ducasse, no Benoît, em Paris.
Mas a disputa pelo sabor foi além desses dois países – e colocou em risco a relação entre Canadá e Espanha, em 1995, quando um barco pesqueiro da Galícia foi surpreendido ao largo da Terra Nova e apreendido pela marinha canadense, dentro das 200 milhas regulamentares. A União Européia apoiou os espanhóis, enquanto, do outro lado do Atlântico, Canadá cerrava fileiras com Irlanda e Inglaterra.
No fim, deu tudo certo e, hoje, o turbot é um dos peixes mais cultivados em fazendas marinhas, atualmente, em todo o Atlântico Norte – na França de Taillevent, inclusive, onde, pra muitos, esse é o linguado dos reis – ou o rei dos linguados.
Quer um site criativo, informativo, pop, dinâmico e bem desenhadérrimo? Vá ao endereço do superstar francês do chocolate, Christophe Michalak, em christophemichalak.com. Além das criações mais recentes, como esses bombons com muita cara de Brasil: sandálias havaianas – lá, eles conhecem como claquettes – e, claro, uma pizza, encontra-se também o seu fluxo de novidades, entre eles a já badalada criação de sua própria escola, a Michalak Masterclass, (60, Rue du Faubourg Poissonnière).
E também o seu novo livro, “Les meilleurs desserts de France”, que lançou pela editora Gründ, com fotos de Patrick Rougereau. Ao contrário do que o título pode sugerir, a livro não fala das receitas criadas pelo pâtissier, líder da confeitaria do Plaza Athenée. Pelo contrário fala da sua releitura de clássicos franceses, como a flaugnarde do Périgord, o fouglof alsaciano, os calissons d’Aix, os mirlitons de Rouen ou o kouign amann da Bretanha. Na Amazon e na Fnac por menos de 30 euros.
Muitas vezes, para derrubar um paradigma, basta tirar uns parafusos que ele cai do teto. E já cai premiado, como no caso do stovetop Bora Classic, um dos vencedores do Red Dot Design do ano passado, em que o exaustor sai de cima do fogão e é recolocano no próprio plano dos bocais – abaixo das panelas, portanto -, o que evita a contaminação do ambiente pela fumaça que se dispersa quando os filtros são localizados em aparelhos acima do fogo. Ou, como declarou o júri do RedDot Design, “um desenho multifuncional, que poupa espaço e cria um alto nível de comodidade a quem usa, por sua tecnologia inovativa”. Nas boas casas do ramo por algo em torno de 4 mil dólares.
(Íntegra da matéria publicada na revista LUXO, de O Globo, em dezembro de 2013, com as resenhas dos restaurantes que visitamos, Luiz Carlos Ritter, Ana Cristina Reis e eu. As resenhas dos restaurantes entraram em posts individuais, para que esse aqui não fique mais monstruoso e carregado do que já é)
A brincadeira que fazemos aqui com o 50 Best, eleição mundial promovida por uma marca de águas minerais e uma revista inglesa, não é gratuita quando falamos de Nova York. Cinco dos monumentos gastronômicos da cidade estão na lista, que contribui com competidores como o Eleven, o Le Bernardin, o Per Se e o Daniel. Faltou o Jean Georges? Não. Ele está na lista do 100 Best, seqüência da mesma votação, mas a gente relaciona assim mesmo.
Em comum a todos eles – e é aí que entra a brincadeira: são todos de influência francesa. As casas de David Chang, que, registre-se, também estão no concurso da água mineral, ficam para uma próxima vez. E para a próxima ficará também o Atera, que estará na próxima lista não somente por qualidade, mas também por coerência
Mas voltando à cozinha clássica, fato é que, depois de tantas influências que os americanos ganham das migrações em suas grandes cidades, o que resiste mesmo, em Manhattan – e classifica mesmo a cidade no concurso – é a turma do 5 Best da escola francesa. Em todos os casos, o atendimento elegante mas sem rapapés, um humor bem dosado, privacidade discreta e, ao contrário dos emergentes, um tempero fundamental para o cliente contemporâneo – a liberdade, inclusive a de fazer fotos, sem a qual essa matéria seria impossível.
A resenha de cada restaurante:
Celebração quase lisérgica em torno do chocolate, conforme a visão artística da Valrhona, que abriu, em outubro, a Cité du Chocolat, na pequena cidade de Tain l’Hermitage, sul de Lyon, três horas ao sul de Paris. Bem ali, às margens do rio Rhône (não me venham com Ródano), temos uma pequena disney sobre o tema, com roteiros programados e visitas guiadas em torno do vício, por meros 10,50 euros por glutão.
São diversos os níveis de roteiros, do infantil ao profissional. Em comum a todos, a degustação interminável dos chocolates da marca, para aplacar a ansiedade em momentos como as experiências sensoriais e o passo a passo, do grão ao choco, sem bulshits do gênero Fantástica Fábrica de Chocolate, que Johnny Depp nos fez o canalhice de arruinar. Resta-nos esse tour gourmet com direito a exposição de arte de chocolate, uma delas a da foto acima.
Virou lugar comum dizer que Nicolas Joly tornou-se uma lenda entre os produtores biodinâmicos. Mas a qualidade dos vinhos que produz e a coleção de paladares, calores, texturas e sabores que esse rótulo nos traz, permite o discurso. O toque mineral, quase xistoso, é inconfundível na região desse vinhedo, que fica em Sevinnières, no Loire. É seco, mas desenvolve frutas como peras e os cítricos que marcam a sua uva, a chenin blanc. Mas vai além dessas notas acadêmicas. Vão e voltam estruturas, texturas e sensações que intrigam – e encantam no início e no fim, com impressões distintas de nariz e boca. É contemplação pura, um vinho que vale a pena tomar a dois – não mais – pela evolução que mostra do primeiro ao último copo.
Essa poderia ser a nota de abertura de uma série, a dos arquitetos à mesa, mostrando a atualidade do design das assinaturas, cada vez mais valorizado. Mas o valor – inclusive o custo das peças – pode fazer sentido, já que muitos deles anteciparam tendências que, hoje, cruzamos com naturalidade nos mostruários e, não raro, diante dos nossos pratos.
É o caso da marca da coleção acima, do escritório de Georg Jensen. um designer de pratas (orfèvre) das primeiras décadas do século 20, quando deixou os adornos de salão para se dedicar a joias e, depois, aos tais talheres. Ele foi um dos primeiros a levar o art nouveau à mesa, quebrando o formato de garfos, facas e colheres clássicos, pesados.
Hoje, a agência que leva o seu nome é uma das mais badaladas do mundo, com desenhos imitados ao longo dos últimos 50 anos, muitos deles assinados por outros expoentes, como Arne Jacobsen, seu compatriota, que esteve no cast do estúdio até morrer, em 1971. Ou o francês Jean Nouvel, que, tal como Arne, era um superstar do mundo dos móveis, que contribuíram com o a chancela “by appointment” da coroa (sem trocadilhos) da Dinamarca.
Este post é a íntegra da matéria publicada pelo caderno ELA Luxo, em O Globo, em que visitamos os cinco melhores restaurantes de linha francesa em Nova York. Os textos com as impressões sobre os demais restaurantes está em:
Mesmo após a confirmação da reserva online, ligue, insista, chateie, choramingue, enfim, implore por uma das mesas junto ao janelão do prédio da Time-Warner, com vista para o Columbus Circle, o Central Park e para o horizonte recortado da East Side. Isso posto, celebre com o champanhe que o sommelier Andrew sugerir, não por luxo, mas pela exigência do abre alas, a comissão de frente do menu, o enredo maior do chefão Thomas Keller, o oysters & pearls, uma emulsão com ostras de Beach Point com caviar do esturjão sterling. Básico.
Entrada fria para aquecer o início do desfile de 10 pratos e pequenos adereços, como as gougères que estouram na boca e a casquinha de salmão, o verdadeiro, de rio, da Nova Escócia. A casa curte seus emblemas e relembra o restaurante que tem em Napa, o French Laundry, com o que chama de “conto de fadas” de berinjela com porós e anchovas. Equilíbrio e consistência de mágico, no caso, o chef Nicolas Ferreira, lugar-tenente de Keller em Nova York.
Quando o momento al mare abre oficialmente o cardápio, já lá se foi um parágrafo inteiro para tentar traduzir a intensidade das primeiras experiências. Inútil. Melhor continuar com o seu black bass do Atlântico. Um dos fascínios dos americanos está no valor de regiões e seus produtores – e sua exibição nos cardápios. O arroz era koshihikari e o creme fresco era de ouriço de Santa Barbara. Mais denominações chegaram com a lagosta – onipresença da estação em todos os restaurantes. Vinha da costa do Canadá, o risotinho de cebola de Vidalia. Temos de descobrir onde fica a fazenda Four Story Hill para internação. De lá vêm as cenouras, as ervilhas e o coelho confitado. Coelho louco, sorri como um Cheshire, Alice não conhece essa maravilha.
Uma pausa rápida para os vinhos de todos os tipos, escolhidos a dedo. De tão extensa, a carta virou um aplicativo para iPad. Parei na página 40, com a chegada do ribeye de vitela, da Fazenda Marcho, logo ali, na Pennsylvania. Textura inédita, sabor. Um naco de guanciale, quatro tipos de tomates marinados, bulbo de funcho confit e estamos conversados. Antes da sobremesa, um fondue de queijo de Albany passou desapercebido. Falaram mais sério com a gelatina de champanhe e, anotem para copiar, os contrastes de melão e hortelã. O que disseram na mesa sobre a crème fraiche de banana é impublicável, especialmente depois do muffin e das castanhas tostadas. A comensal tinha razão: mais do que luxo, luxúria.
PER SE
The Time Warner Center
10, Columbus Circle, 4th floor
No mapa: Broadway com 8a. Avenida e Rua 59.
New York, NY
No metrô: 59th Columbus Circle
Reservas, Open Table
Tel.: +1 212 823-9335
Não adianta tentar enganar ou dar uma de blasé: aquele rolo de facas novinho, arrumadinho, reluzente, afiado, imaculado inspira um sorriso infantil em qualquer um que cozinha. Nesse kit aí acima, o efeito é o mesmo, mas com quem cuida dos bares, os bartenders, hoje conhecidos como mixologistas.
Trata-se do McSology Tool Roll, um rolo em brim branco, com um arsenal de colheres, coadores, medidores, picadores de gelo, faquinhas e faconas, mexedores e descaroçadores, abridores e saca-rolhas, todos acondicionados nos bolsos de um autêntico painel com lugar até para cartões de visitas.No site da marca, em www.mcsology.com, por apenas 175 euros.
Este post é a íntegra da matéria publicada pelo caderno ELA Luxo, em O Globo, em que visitamos os cinco melhores restaurantes de linha francesa em Nova York. Os textos com as impressões sobre os demais restaurantes está em:
Ver um restaurante como o Le Bernardin na lista dos 50 do mundo traz esperança a qualquer coração gourmet. Explico o arroubo: no geral, é o 19º colocado da lista do 50 Best, mas, poucos notaram, é o líder do ranking entre os restaurantes com um serviço normal, à la carte, com o garçom perguntando o que monsieur (en français, bien sûr) quer de entrada, prato principal e uma das sobremesas que devem ser pedidas com antecedência.
Outro: é também o mais bem colocado entre os restaurantes dedicados aos frutos do mar.
Na mesa, além da elegância do linho, apenas pratos brancos, contraste fundamental para um clássico bem feito, sem instrumentos cirúrgicos, acessórios de dissecação, canudos e pipetas, vulcões fumegantes. Assim chega o carpaccio de atum da foto acima, na forma de uma lâmina contínua, da bela cor vermelha do peixe, com os condimentos quebrando a textura muito lisa do peixe cru.
Sim, há um menu degustação para quem quiser, mas o melhor do cardápio do Le Bernardin é explorar as suas seções, que dizem muito sobre a delicadeza que deu fama ao restaurante. Há o “Almost Raw”, ou quase cru, para ostras, tartares e o capaccio. Há o “Barely Touched”, para o que foi mal tocado, quase imaculado, com peças como as de polvo ou de truta ligeiramente selados ou levemente cozidos. E há o “Light Cooked”, preparado com leveza.
É daí que vieram o black bass, um tipo de cherne, de pele morena e carne gulosa; o bacalhau fresco, quase rosado pela exposição leve ao calor; e a arraia, firme, macia, suculenta. As sobremesas seguem a filosofia do restaurante – tanto chocolate, primoroso, quanto o confeito de frutas vermelhas estão ali no esplendor, mas a arquitetura (Carême não disse que a confeitaria era um ramo da arquitetura?) remete às grandes referências francesas, como o Astrance, o Arpège e, claro, Alain Ducasse.
LE BERNARDIN
155 W 51st Street, entre 7a. e 6a. Avenida
New York, NY 10019, Estados Unidos
Reservas: Open Table
Confirmações: +1 212-554-1515
Metrô: 7th. Ave (B,D,E)
Ok, Sophia Bergqvist não é um nome de origem portuguesa – convenhamos, na área dos vinhos do porto, poucos o são. Mas o sotaque bem lusitano da proprietária da Quinta de la Rosa mostram a altivez portucalense com que a sua família comanda a vinícola há quase um século. É bem verdade que os seus primeiros rótulos, que colava pessoalmente em cada garrafa, têm apenas duas décadas. Mas também é verdade que sua marca já é a quinta de um mercado exigente como o de Londres.
A modernidade de seus vinhos é uma das linhas de frente de sua adega, que tem como vizinhos nomes bem conhecidos como as quintas do Vallado e da Romaneira. “A estrutura é o elemento de ligação entre os nossos vinhos desde que começamos a produzi-los”, conta Sophia, que conta com o enólogo Jorge Moreira para fazer com que, a cada ano, possam evoluir a estrutura de guarda de seus rótulos.
Recentemente, ela mesma trouxe ao Brasil a sua linha de vinhos nobres, da Quinta de La Rosa, com rótulos graciosos na aparência, no nariz e na boca, todos eles no catáçogo da importadora Ravin. Em comum aos brancos e aos tintos, a estrutura, de acidez esplêndida, o equilíbrio das notas e a fineza dos taninos e dos indicadores dos bons potenciais de guarda, que confirmam as palavras da crítica Jancis Robinson a respeito não dos portos mas dos vinhos de mesa da região: é a Borgonha portuguesa.
A expressão vem do japonês しそ, que define a folha aromática, de forma de um naipe de espadas, mas de bordas raiadas, de planta da família do hortelã, apesar de chegar ao tamanho de uma mão, quando aberta. Seu paladar fresco mas forte, penetrante e dominante é usado com parcimônia em preparados que dominem a sua potência, como no caso de alguns refogados e de certo tipo de tempura, quando tona-se tão crocante quanto seu empanado.
Nipônicos, chineses (紫蘇 – ‘zi su’) e, principalmente, coreanos, que a conhecem como jaso (자소), quando verde, ou chajogi (차조기), no caso da roxa, aplicam o shiso (pronuncie “shissô) em refogados, aos quais transmite um travo quase cítrico. Ou ainda como um invólucro para o bulgogi, o churrasco coreano. Outra aplicação é a condimentação de caldos e, principalmente do arroz, quando, verde ou vermelha, eleva o arroz a novo padrão de paladar.
Mas, por sua cor forte e pela forma perfeita, além da textura aveludada, é, acima de tudo, um elemento na decoração de drinques contemporâneos, aos quais conferem o frescor de componentes como o lemoneno (travo cítrico) e o perilaldeído (seu sabor de menta selvagem) em saladas e pratos em geral, inclusive os sushis e sashimis. Na área da farmacologia, o shissô é considerado um antibiótico natural contra organismos que ataquem o intestino e tem importância na prevenção e no combate a males respiratórios, asma inclusive.
Este post é a íntegra da matéria publicada pelo caderno ELA Luxo, em O Globo, em que visitamos os cinco melhores restaurantes de linha francesa em Nova York. Os textos com as impressões sobre os demais restaurantes está em:
Dissemos antes, insistimos agora. O restaurante de Jean Georges não está na lista dos 50 Best. Mas está na relação dos 100 Best, que a tal revista Restaurant não divulga muito, mas que indica quem sobe. O chef alsaciano está sempre ascendente. Antes de mais nada, as recomendações para reserva: antecedência, pedir main room e ir no almoço, para aproveitar o preço melhor e a luz do dia, que os janelões do salão acendem para dar novas cores aos pratos.
Aconteceu algo ali que não se viu nos demais restaurantes desta relação: o chef estava presente. Apressado mas atento, mal pôde conversar sobre como sela aquela couve-flor que guarnece as vieiras, como concebeu a granola com o foie gras, de onde tirou aquele caldo de salsas para a trilha ou, finalmente, de onde vem aquele frango – sim, frango, não se iniba – com raça e aroma da mais fina caça. No serviço, é o mais francês de todos, com maitres e garçons coordenados no serviço. Luís XIV vive.
“O céu aqui é mais alto”, comentou o guru Luiz Carlos Ritter, responsável direto pela qualidade das escolhas de endereços, pratos, enfim, de cada passo dessa caminhada pelos sabores da cidade.Talvez ele estivesse também se referindo à altitude do trio de chocolates, da altivez do melão e do pêssego, que adoçam o almoço, a memória, a existência de quem sabe que uma grande metrópole começa mesmo na cozinha.
JEAN GEORGES
Trump Hotel Central Park
1 Central Park West
New York, NY
Reservas: OpenTable.com
Confirmações: +1 (212) 299-3900
Metrô: 59th St. Columbus Circle
Este post é a íntegra da matéria publicada pelo caderno ELA Luxo, em O Globo, em que visitamos os cinco melhores restaurantes de linha francesa em Nova York. Os textos com as impressões sobre os demais restaurantes está em:
Nosso bom, simpático, agradável Daniel Boulud, valente e cansado de guerra. Seu restaurante é um mega clássico de Nova York, com todas as condecorações de desbravador da selva da gastronomia americana, em fins dos anos 80, quando chegou, viu, venceu – e, depois, cresceu e multiplicou-se, em trajetória para todas as reverências e com princípios bem nítidos, como na entrevista que concedeu em 2012, quando esteve no Rio, dando um show e deixando bem atrás os seus companheiros do jantar que a Zahil promoveu.
Por isso, dá gosto de ver o gosto que os americanos têm em respeitar a tradição do ambiente pesadão, de pouca ou nenhuma iluminação e muita compostura, lotado de ternos e gravatas que só se afrouxam no bar ao lado, onde estilo de roupa e faixa etária mudavam radicalmente. O serviço foi errático no bar, demorou na mesa, hesitou diante da carta de vinhos mas engrenou após os pedidos. E como…
No cardápio, vale a corrente: em todos os restaurantes da moda em Nova York, a estação manda nos pratos. Assim foi com os frutos do mar da entrada, os caranguejos peekytoe, em que Daniel, como poucos atua com a sua fusão da hotelaria França com a nova América: abacates com azeitonas na guarnição. O mesmo com as vieiras, com a sauce diable de outrora. Ou ainda com os abalones, sua escarola, seus croquetinhos de arroz.
A grande cozinha confirmou-se nas carnes, com a cela de coelho recheada com chouriços e com a vitela com molejas – lá, os sweetbreads. E também com as sobremesas, com o coulant de chocolate guanaja, o espelho de pêssegos, com o baba, não ao rum, mas com o licor chartreuse. Em frente ao Central Park, estamos no coração de uma Paris que não se entrega.
Coulant de chocolate guanaja (FOTO Thomas Schauer)
DANIEL
60 East 65th Street (entre Madison e Park Avenue)
New York, NY
Reservas: OpenTable. com
Confirmações: +1 (212) 288-0033
Metrô: nenhum a menos de três quadras. O mais próximo é Lexington Av/63th.
Houve um tempo em que Bucellas era famoso por ser um vinho licoroso e, hoje, quase desaparecido sob a modernidade dos portos, madeiras e moscatéis de Setúbal. Fez fama entre viotrianos e elisabetanos. Mas temos aqui o lado moderno de Portugal – e da nova denominação Lisboa, antiga Estremadura – que mostra a suas faces e suas cores, neste caso, muito claras, além das citrinas, com reflexos esverdeados de vinho fresco.
No nariz, notas de frutas (laranjas) e ervas. Na evolução, flores do campo, que eu sempre estranho, mas ali estão leves e adoráveis. É um vinho seco, extremamente refrescante, de acidez equilibrada e que não deixa rachar a boca apesar das frutas cítricas sempre presentes. É uma boa compra e pode ser tomado como um thirst quencher ou para acompanhar crustáceos como ostras ou mexilhões, carpaccios de peixes ou ceviches idem.
RÓTULO:Bucellas Arinto 2011 Caves Velhas
PRODUTOR:Adegas Camilo Alves
PAÍS:Portugal
REGIÃO:Bucelas, Lisboa
UVAS:Arinto (100%)
ÁLCOOL:12,5%
QUEM TRAZ: Barrinhas
Tudo bem, Alain Ducasse, no Louis XV; Eric Ripert, no Le Bernardin e, agora, David Rumm, no Eleven, fizeram seus brulés, chegou a hora de fazermos o nosso, bem brasileiro. E na mesa, na frente do cliente, com direito a show pirotécnico: são os ovos brulés do Esplanada Grill, fritos como convém, com a gema cremosa, e arrematados, na mesa, conforme o gosto do cliente pela clara um pouco mais firme. É uma brincadeira, claro, com tons de homenagem, que sugerimos como acompanhamento para quem gosta de um bom steak a cavalo.
(Observação: antes que os apedeutas de plantão critiquem o meu “brulé”, dou logo uma informação que eles não têm: ovo é masculino, em português ou em francês. Se fosse “ova”, aí sim, seria “brulée”)
O bom atum pode ser maior e mais pesado do que uma bela vitela. Os chefs mediterrâneos sabem disso muito bem. Os sushimen, mais ainda. E todos eles selecionam direitinho o corte do peixe que vai servir à sua receita, seja ela crua, grelhada, curada ou em conservas. Por isso, desenhar o atum com aquele mesmo pontilhado dos cortes de carnes bovinas faz sentido em muitas cozinhas do mundo, dando a peças antes desconhecidos no Brasil resultados tão diferentes quanto aqueles que separam costelas e picanhas nas churrascarias.
Aos poucos, alguns desses resultados começam a chegar por aqui – e já estava mesmo na hora, pois, em Portugal, o culto em torno das carnes do peixe, que variam do rosado leve ao vermelho profundo, chega às mesas em estilos, raças e fórmulas impensáveis – ou alguém já pensou um curtir uma boa carne seca de atum? De Lisboa a Barcelona, isso é bem comum. Nesse eixo, é possível encontrar a moxama, que é exatamente a carne salgada e seca em mantas, que são cortadas em fatias finas e degustadas com um belo vinho de jerez.
OS GÊNEROS E AS ESPÉCIES
(Fonte: A Enciclopédia dos Sabores)
Aku (Havaí)
Denominação nativa dos ilhéus que os americanos do continente vêm adotando em seus cardápios, em estilo semelhante ao do ahi e do mahi-mahi. No Japão, é conhecido como katsuo.
Ahi
Originalmente, a’ahi. Variedade de atum do Pacífico, que os japoneses conhecem como ‘kihada’ (yellowfin, no mercado internacional) e que é tida como uma espécie relacionada à albacora. É pesca de verão, quando a carne do peixe estará em sua plenitude para a grelha ou para a arte do sushiman, como repara Alan Davidson em seu monumental Oxford Companion to Food.
Ahi palala (Havaí)
Uma das denominações ancestrais que os havaianos conferem às albacoras (Thunnus alalunga e albacares).
Albacora
Thunnus albacares. Variedade menor de atum, explorada pela indústria, mas apreciado na grelha.
Asinha (Portugal)
Thunnus alalunga. Uma das denominações que os pescadores portugueses conferem à albacora.
Bacoreta (Espanha)
Denominação genérica que as espécies menores de atum, entre eles o ‘bonito’ e a ‘albacora’, ganham no mercado espanhol. Formalmente, é a denominação da espécie Euthynnus alletteratus.
Bandolim (Brasil)
Uma das denominações que a albacora ganha nas águas brasileiras.
Bandolim (Brasil)
Denominação que os pescador do Sudeste e do Nordeste conferem a duas variedades de atum: a albacora gorda (Thunnus obesus) e a albacora-branca (Thunnus albacares).
Bonito
Bin chao (Japão)
De 鬢長, uma das denominações que os japoneses conferem às albacoras, uma das variedades de atum mais prezadas pela indústira pesqueira. Também denominado binnaga (びんなが).
Bonito
Uma das variedades menores de atum, muito usado pela indústria dos enlatados. Mas isso não é demérito. Pelo contrário, algumas das melhores conservas desse tipo de peixe está nas migas de bonito, que pode se encontrado, pronto para uso, na Casa Flora.
Cachorra (Brasil)
Uma das denominações que a albacora gorda (Thunnus obesus) recebe dos pescadores brasileiros. Em Portugal, é conhecida como ‘patudo’ e é uma das iguarias servidas no Cantinho do Avillez, em Lisboa.
Carorocoatá
Uma das denominações da albacora-branca (Thunnus alalunga). Não procure. A expressão foi ignorada pelo sr. Aurélio Buarque de Hollanda Ferreira.
Honmaguro (Japão)
Variedade de atum (鮪 – ‘maguro’) denominado ‘negro’, no mercado internacional. É objeto de pesca industrial e de culto artesanal, especialmente no norte do Japão, onde ainda é pescado na linha, apesar de atingir até 400 libras.
Hosokatsuo (Japão)
Variedade de atum de carne esbranquiçada e mais oleosa – mas não menos saborosa – do que as demais espécies. Por ser mais esguio do que os demais, é reconhecido pela denominação internacional slender tuna.
Katsuo (Japão)
Katsuwonus peleamis, na denominação científica do atum conhecido no mercado internacional como skipjack tuna. É uma variedade menor, mas muito apreciada no balcão do sushi, na grelha do teriyaki e, quando seco e raspado, na composição de caldos como o dashi e o katsuobushi.
Kihada (Japão)
De 木肌. Variedade de atum prezada pelos filés e postas que seu lombo de carne vemelha proporciona, ao longo de seus quase dois metros de envergadura – e, mais ainda pelos cortes de sua barriga gordurosa, ideal para alguns dos mais finos sushis – especialmente mo verão, como observa Alan Davidson. Suas nadadeiras traseiras, inclusive os barbilhões que lhe saem do dorso, são tingidas de belo tom amarelo, o que justifica a denominação “yellowfin tuna”, que a espécie ganha da comunidade internacional. A denominação vem sendo usada pelos comerciantes brasileiros, em detrimento de denominações originais, como ‘albacora-de-laje’ e ‘galha-amarela’, raramente usada nos negócios ou mesmo nos cardápios.
Kimeji (Japão) Denominação que os cardápios japoneses conferem à carne do jovem e ainda pequeno atum do tipo ‘ahi’ ou ‘yellowfin’. Quando adulto, passa a ser rotulado como ‘kihada’ ou ‘kiwada’ – e a ser prezado por sua carne vermelha e gordurosa.
Maguro (Japão) Japonês para ‘atum’, por interpretação oxítona do ideograma 鮪, o mesmo que o mandarim e o cantonês usam para identificar o peixe. Das madrugadas nos mercados às noitadas em bares e sushi-bares, o atum é arrematado em leilões e as carcaças, algumas de até 400 quilos de peso, proporcionam cortes para caldos e sopas, como convém ao café da manhã, grelhados (‘teriakis’ e ‘shioyakis’) ou cozimentos leves (‘nimono’) durante o dia e, nos grandes momentos, os cortes para sushis e sashimis, especialmente quando extraídos da barriga, como os prezadíssimos ‘toro’ e ‘chutoro’.
Patudo (Portugal, Açores)
Variedade menor de atum, dito albacora, reconhecida pelos olhos esbugalhados e o corpo curto, que raramento supera o metro de comprimento. A carne é branca, macia e untuosa, que faz belo papel na grelha.
Rabão
Deliciosa denominação que o atum ganha dos angolanos.
Rabil
Uma dos rótulos que a albacora (Thunnus albacares) ganha nas costas lusitanas, especialmente nos Açores e na Madeira.
Skipjack
Variedade de atum de alto valor comercial, mais conhecido no mercado internacional como ‘bonito’. No Pacífico, é abundante desde as águas da Nova Zelândia até as costas furiosas do Canadá. Boa parte de sua produção é destinada à indústria de conservas, que pode ser a de enlatados ou da secagem, que, no Japão, proporciona a raspagem da carne seca para a produção de flocos, que comporão compostos para sopas ou temperos como o ‘sishimi togarashi’.
Soudagatsuozoku (Japão)
De 宗太鰹属, pequena variedade de atum, usada em ensopados, raramente cru.
Tonno di tonnara (Itália) Atum pescado no litoral e levado ainda fresco para corte e venda. ‘Tonnara’ é o sistema de redes que desvia a rota migratória dos atuns, cercando-os, o que permite que sejam arpoados e levados frescos aos portos próximos.
Tónos (Grécia)
Interpretação de τόνος, na grafia original que o atum ganha dos gregos desde os tempos em que a expressão arcaica grego “thunnos” (θύννος) influenciou o latim thunnus, adotado por Lineu, no século XVIII, para denominar o gênero que envolve espécies como o atum que conhecemos e outros, como o bonito e a albacora.
Yellowfin
Literalmente, “nadadeira amarela”, referência à cor das barbatanas desta espécie de atum (Thunnus albacares), o segundo maior em tamanho, também conhecido como ‘ahi’, pelos americanos, rabil pelos portugueses, atum branco, no mercado brasileiro. É prezado pela bela carne vermelha de seu lombo e pelos cortes de sua barriga gordurosa, ideal para alguns dos mais finos sushis – especialmente mo verão, como observa Alan Davidson. É festejada também em grelhas, na forma de yakitoris, e nas cartilhas ambientalistas, por ser uma opção ao ameaçado atum azul.
OS CORTES
Akami (Japão) Denominação que recebe a carne magra (あかみ) e avermelhada (‘aka’) de cortes traseiros de peixes como o atum ou mamíferos como o boi ou a baleia.
Bodano (Itália)
Um dos filés que se extrai da parte interna da barriga do atum. Seria um dos equivalentes ao chutoro, do item acima.
Chutoro (Japão)
De 中とろ. Uma das variedades de carne da barriga do atum de teor médio de gordura, intermediário entre o ‘toro’, mais gorduroso, e o ‘maguro’, menos gorduroso.
Codina (Italia)
Corte traseiro do atum, entre os lombos e a barriga e os pequenos segmentos da cauda. Por integrarem a parte motora do peixe e por darem o impulso às suas velocidades altíssimas dentro d’água, são músculos irrigados (vermelhos como a codina negra) e magros (codina branca), dando assim sabores distintos aos cortes mais comuns do peixe.
Garrofeta (Espanha, Alicante)
Ovas salgadas e secas de bonito, denominadas assim pela semelhança com as vagens de alfarroba, comuns na região.
Mendreska
É a versão basca da ventresca, a barriga do atum, apreciada no marmitako e no sorropotún.
Moxama, mojama (Espanha, Portugal)
De “musama”, forma como os mouros se referiam ao atum seco e curado em sal, que se come fatiado, como petisco ou em sanduíche. Tradição local, pode ser encontrado em pacote, nas boas casas do ramo.
Muriá (Brasil)
Conserva de carne de atum no sal, em estilo semelhante ao da estopeta portuguesa.
Stallo (Italia)
Corte geral do lombo do peixe, maior e mais usado – é mais barato e integra preparos menos delicados, como os grelhados e os sushis comuns.
Sunazuri
Parte dianteira da barriga do atum, localizada dentro da área já nobre do o-toro e de tom rosa claro, tal o nível de marmorização com a gordura característica do corte.
Tarantello
Parte posterior da barriga do atum, menos densa e mais aberta para sustentar os órgãos do peixão.
Tonyina de tronc
Filé de atum salgado. É dito “de tronc” por ser cortado em filés que, após a cura, assemelham-se a troncos de madeira.
Toro
Diz-se de toda a área cortada da barriga do atum, que fornece carne rosada, delicadíssima e que derrete na boca com a untuosidade de seu alto nível de gordura. Como em todos os casos de elementos nobres, é mais conhecida e reverenciada como ‘o-toro’, especialmente pelos sushimen mais sérios, que dedicam madrugadas a fio de suas vidas em busca dos melhores cortes nos mercados de peixe – ou no desembarque dos barcos, já que o cuidado com o transporte por terra raramente é confiado aos pescadores. Pela dimensão da peça, pode fornecer cortes específicos, entre eles o chutoro, que alcança preços no mercado ainda maiores do que o toro comum já atinge.
Ventresca
Mais uma vez, a barriga do atum, mas aqui sob o ponto de vista dos sicilianos e dos andaluzes. Pode significar tanto a carne, que é magnífica mesmo quando enlatada (há uma variedade excelente, vendida no Venga), ou o salsichão preparado com os miúdos do peixe.
Ao contrário das peças de gado, que variam de país para país, os cortes de atum são basicamente os mesmos em todo o mundo, da Sicilia ao Japão. A parte do lombo, mais vermelha, ganha quatro separaçõesque geram filés para a grelha e cortes mais delicados para fórmulas modernas como o carpaccio. A parte posterior, conhecida como akami, é mais escura e muito prezada pelos conhecedores. “A parte escura é a mais exigida quando o atum nada”, explica Alissa Ohara, do Azumi. “Não é um corte tão nobre quanto a barriga, mas é mais pura e magra, o que dá a noção perfeita do peixe”, diz.
Ao falar em barriga, Alissa refere-se à alta procura – e ao alto valor – das partes de baixo do atum. Para os ibéricos e os italianos, é a prezadíssima ventresca. No reino dos sushis, é a grande preciosidade por causa da gordura entremeada. “A carne fica quase branca, mesmo em espécies menos nobres, como a de rabo amarelo (no mercado internacional, o yellowfin), mais comum no Brasil. Os maiores, os japoneses levam”, lamenta.
AS FÓRMULAS E OS MEIOS
(Fonte: A enciclopédia dos Sabores)
Carpaccio
Prato similar aos preparados clássicos com carnes, mas com duas diferenças importantes. A primeira, o corte, que deve ser menos fino para manter o paladar do peixe. A segunda, o tempero, que deve levar não mais do que um fio de azeite e apenas um espirro de limão, como é o do Gero. O excesso marcará a carne.
Ceviche
Solução da moda, mas de eficácia duvidosa, já que a carne perde sua cor brilhante com a ação dos cítricos. E reage de forma menos suave do que nos preparados originais, com os peixes brancos.
Conserva
Forma mais comum de se encontrar o atum é a lata, com a carne do lombo ou da barriga imersa em azeite após cozimento leve. Entre os ibéricos, fórmulas antigas como a estopeta e a moxama são secos ou conservados em salmouras.
Grelha
Três fórmulas famosas de uso do atum em chapas ou grelhas: os bifes de atum dos portugueses, o tonno ai ferri dos italianos, os teriyakis dos japoneses
Massas
Não as massas de atum, mas as que levam a sua carne, como no caso de pizzas e pissaladières e certos tipos regionais de pastéis e empadões.
Pizza
No caso, a de atum, cobertura de um dos clássicos da pizza internacional que o peixe batiza, em conservas ou cozido, em presença com outros ingredientes ou solo, como no caso das variações da pissaladière.
Salada
Fórmulas clássicas para a salada do atum: o maionese de sua carne cozida e desfiada, que vai gerar um dos sanduíches mais consumidos entre os americanos. E os mediterrâneos niçoise e xató, que ganham verbetem específicom logo abaixo.
Sashimi, sushi
Fórmula clássica da apresentação do atum entre os japoneses – e, convenhamos, a melhor forma de degustar os seus cortes diferentes.
Sopas e ensopados
Quando aquecido ou cozido em pontos adequados, a carne dos atuns torma-se branca e delicada, mas mantendo uma firmeza que permite a presença em ensopados consistentes como o bull catalão, o marmitako basco ou a feijoada de barriga açoriana. Ou em sopas mais finas, como as claras dos japoneses ou a garudhiya das Malvinas.
Tartare
Fórmula bem adequada à carne de lombo do atum, que pode reproduzir a firmeza e a cor de carnes que dão origem ao tartare original, embora os cortes devam ser mais rústicos, sem o picado fino que caracteriza o prato. Por ser cortado no mesmo estilo, há quem diga que o poke havaiano é um meio termo entre os tatakis japoneses e os ceviches peruanos.
AS ESPECIALIDADES
Aguacates rellenos (Mexico)
Um clássico caseiro, é a metade de um abacate recheado com uma maionese de atum em lata bem misturado com ovos cozidos, tomates e cebolas. Receita fácil e fresca para consumo imediato.
Al ferro
É o filé do atum em porção grande quanto um medalhão, que é selado na superfície externa, em calor rápido mas intenso, de forma a manter a tenrura e a bela cor do interior.
Atún com manteca (Espanha, Andaluzia)
A manteca no caso é banha de porco, que refoga alho e recebe um medalhão de atum temperado com sal, pimenta, tomilho e louro. A receita recomenda vinte minutos de cozimento lento até que se misture um copo de jerez e se levante o fogo por mais cinco minutos. É uma especialidade da cidade andaluza de Cádiz e deve ser degustado frio com a própria gordura do prato.
Atum de barrica (Portugal, Algarve)
Diz-se do atum salgado e conservado em barricas, segundo método que, garante-se, é anterior ao da técnica do bacalhau. Com a exposição à salmoura, a carne torna-se escura e firme, exigindo longo demolho – há quem prefira lavar – antes de ser usado, seja no corte fino para gerar as estupetas, seja para o preparo com batatas. Em algumas regiões, é conhecido como ‘atum preto’ e é preparado com partes do peixe que não eram usados pela indústria de enlatados.
Barriga de atum (Portugal, Açores)
Iguaria preparada com a nobilíssima carne do ventre de atuns, bonitos e congêneres. Os cortes são consistentes e próprios para a grelha, para os guisados ou para a feijoada de barriga, preparada com feijões, paios e refogado de alhos e tomates.
Bifes de atum de cebolada (Portugal)
Rudimento do escabeche em que o vinagre e a cebola entram na marinada de cortes grossos de lombo ou de barriga de atum fresco, que, então, vão à frigideira com azeite quente. Pronto e reservado, levam-se os elementos da marinada para a frigideira e, após rápida redução e dourada, cobre o bife, já no prato.
Bull de atún (Espanha, Catalunha)
Cozido de atum com carne de coelho, um dos expoentes do estilo ‘mar y muntanya’.
Dashi (Japão)
Caldo de atum seco (katsuobushi) ou algas (kombu) e molho de soja. É a base de sopas e preparados conhecidos nos restaurantes japoneses brasileiros.
Empanada de atún (Espanha, Galícia)
Torta fina recheada com refogado picante de atum com cebolas, pimentas e pimentões. Está entre os tapas típicos da Galícia, onde é servido em fatias e degustado frio.
Escabeche (Portugal)
Preparado tradicional entre os portugueses, é o atum cortado em bifes, grelhado levemente e curado longamente em azeite, vinagre, cebolas, e pimentões.
Estopeta, estupeta (Portugal)
Conserva salgada de carne de rabada de atum. É melhor como petisco do que como ingrediente de pratos elaborados, que pode marcar com o caráter forte da salmoura.
Feijoada de barriga (Portugal, Açores)
Guisado de barriga de atum em cubos ao qual mistura-se um cozido de feijões-manteiga, embutidos e um refogado de tomates, alhos e cebolas em azeite e vinho branco. Serve-se com arroz branco como uma das especialidades das ilhas, onde se pescam, garantem muitos, o melhor atum do Altântico.
Lakerda (Turquia)
Conserva em salmoura de atum cortado em nacos. É um dos integrantes da ‘mezze’ turca.
Marmitako (Espanha, País Basco)
Especialidade basca, é um ensopado de carne de atum cortada em cubos, levemente dourada e ligeiramente assada em um refogado consistentes de tomates, cebolas, alhos, pimentões e vinho branco.
Marmite (Espanha)
O mesmo que ‘sorropotún’, guisado de carne de atum e batatas picados em cubos e preparado em cazuela, com cebolas, tomates, pimentões, azeite e vinho branco. A denominação da especialidade, presente em praticamente toda a costa norte da Espanha, aplica-se à região oeste da Cantábria, especialmente no porto de San Vicente de la Barquera, situado entre Santander e o litoral das Astúrias.
Pan bagnat (França, Provence)
Dialeto de Nice para “pão ensopado”, referência ao azeite de oliva abundante que molha um recheio similar ao da ‘salade niçoise’ – anchova, ovos cozidos e legumes crus como cebolas, tomates, pimentões e azeitonas. De sanduíche proletário, montado com ingredientes baratos mas frescos, passou a especialidade local com direito a uma receita oficial, para destacar a fórmula original dos desenvolvimentos modernos. Esta receita original prevê a substituição das anchovas por atum cozido, tal como ocorria nas épocas de escassez.
Pastel com diabo dentro (Cabo Verde)
Pastel frito de massa de milho ou batata recheado com uma mistura vermelha como o diabo do nome, de atum fresco picado com cebolas e tomate.
Poke (Havaí)
Contribuição havaiana para o universo dos peixes crus, é uma tigela de peixes como o atum ou crustáceos como o polvo cortado em cubos grandes e marinado com shoyu e guarnecidos com algas e, em prato à parte, arroz do tipo ‘gohan’.
Salada de atum
Menos uma salada e mais um sanduíche de atum desfiado e combinado com maionese, cebolas, cebolinhas, azeite do bom e algum vigor para transformá-lo em uma com alguma consistência para aguentar a pressão do abocanhar sem que corra para os lados. É um ícone da discreta mas gulosa gastronomia que sustenta as aventuras de Calvin e Hobbes.
Salada niçoise (França, Provence)
Clássica e refrescante salada de tomates, alho, cebola, azeitonas, feijões verdes, anchovas, atum e ovos cozidos, todos temperados com alho, azeite e vinagre.
Shijo (Japão)
Originalmente, 市場. É como os japoneses se referem aos seus mercados de peixe, que expoem parte da cultura alimentar da região na figura dos mais diversos peixes e crustáceos frescos ou em conservas diversas. Dependendo do porto em que se situa, sedia os movimentados e histriônicos leilões de pescados, principalmente do atum, que vai servir os restaurantes da região. Os shijo são também importantes pontos de encontro, onde se degustam especialidades feitas com produtos sabidamente frescos.
Sorropotún (Espanha, País Basco)
Nome complexo para receita simples de carne de atum e batatas picados em cubos e guisados em cazuela, com cebolas, tomates, pimentões, azeite e vinho branco. A denominação aplica-se à especialidade na região entre Santander e as costas bascas, especialmente nos portos de Laredo e Santoña. ‘Outros ingredientes, como os mexilhões a substituir o atum, podem variar de porto para porto, de bairro para bairro, de família para família.
Tekkamaki (Japão)
Ou てっかまき, na grafia original deste que é o mais famoso dos ‘makimonos’. Trata-se de um sushi de tiras de atum cru, que recheia um enrolado de arroz e alga, em forma de bastão. Este bastão é cortado em seções pequenas, ideais para o bocado. Conta a lenda que a iguaria teria sido criada por um nobre que, viciado em jogo de cartas, pediu que enrolasse seu sushi em alga, que manteria a mão seca – sushi, come-se com os dedos – e hábil para o manuseio do baralho. O mais provável, porém, é que se trate de uma variação do ‘donburi’, tijela de arroz com que se cobre com carne crua de atum.
Tonno di tonnara (Itália)
Atum pescado no litoral e levado ainda fresco para corte e venda. ‘Tonnara’ é o sistema de redes que desvia a rota migratória dos atuns, cercando-os, o que permite que sejam arpoados e levados frescos aos portos próximos.
Tonno i fagioli (Itália, Calabria)
Salada fria de atum cozido e desfiado com feijões brancos ou jalos. Integra a constelação do antipasto e pede pedaços de pão de crosta e miolo macios.
Uova di tonno (Itália, Sicilia)
Denominação alternativa que os sicilianos conferem à ‘bottarga’, ovas prensadas, salgadas e secas de atum ou outros peixes, como a tainha e o bacalhau.
Vitello tonnato
Antipasto toscano, uma salada fria de vitela cozida e fatiada, servida com um molho fino de atum, anchovas, alcaparras e sumo de limão.
Xató
Salada de bacalhau desfiado, atum e anchovas em boa conserva e devidamente desfiados, endívias e azeitonas regadas com molho de amêndoas, alho, pimenta e páprica pilados juntos e umedecidos com azeite e vinagre.
É vigoroso, mas elegante; é aromático e complexo; é rico mas não é caro. Esta é o Viña Alberdi, um vinhos considerado como uma das melhores relações custo-benefício do mercado. Mesmo em restaurantes mais chiques, como o Esplanada Grill, onde experimentamos, o preço é excelente para o brilho deste tinto, em que não há cortes, não há correções, como é comum na sua região, a Rioja Alta.
Lá, o rótulo é uma das reservas da casa, que explora o vigor da uva tempranillo, colhida de vinhas com mais de 30 anos e que repousa dois anos em barricas de carvalho francês. Tanto no nariz quanto na boca prevalece uma festa de frutas vermelhas – de cerejas a morangos – e um toque de caramelo em uma estrutura lisa, aveludada, adorável para risotos, massas ou carnes de grelha delicada.