Falar sobre grãos é, acima de tudo, um exercício de fuga do óbvio. É evitar trocadilhos infelizes como “a volta do grão mestre” ou títulos decadentes como “de grão em grão”. Porém, no rastro de nossa matéria de capa dessa edição, notamos, como quem não quer nada, que esses grãos ajudaram a encher o nosso papo ao longo de 5 anos de EatinOut.
Para quem sentiu falta da festa pela data, trazemos uma atração dos palcos e das telas: a simpática figura do cantor (e agora ator) Leo Jaime deu uma graça a mais ao perfil gastronômico que pautamos em cada edição. Hoje um homem multimídia, ele mostra, com sua irreverência habitual como cresceu e desenvolveu sua paisão pela gastronomia, em entrevista exclusiva à jornalista Laura Cavallieri.
Por falar em aniversário e os fãs de cinema estejam celebrando os 40 anos de O Poderoso Chefão, não foi por isso que fizemos um especial sobre a Sicília. Na realidade, sequer citamos Don Corleone ou qualquer das locações do filme, que, áridas, deram lugar a um moderno e produtivo centro produtor. De vinhos especialmente – e essa é sempre a nossa celebração. E foi por isso que reviramos a ilha, de norte a sul, para trazer essa, que é uma das mais festejadas surpresas das adegas atuais.
Se o caminho da moqueca na história culinária é tortuosa, para o meu caso é ainda mais estranho: passa pela França, volta pelo Alentejo, passa por São Conrado e prossegue, claro, no Chile. Explico: a melhor moqueca que já experimentei foi em Paris. Cécile, dona de um hotel na Rue de Rennes, era fanática pelo Brasil. Ia trabalhar com a camisa amarela da seleção e fazia o samba ressoar em Montparnasse sempre que chegava um brasileiro – quase toda a sua ocupação dos quertos vinha do Brésil.
Em sua casa, a meio caminho entre Paris e Meaux, ela aperfeiçoou a receita, que preparava com artigos que contrabandeava – e servia com salada de mâche. Mas explico o caminho tortuoso que citei: se considerarmos a etimologia, a palavra moquém, jamais seria o ensopado, geralmente de frutos do mar, em base de leite de coco com azeite de dendê. Moquém é técnica ancestral de curtição de carnes em grelha sobre fogo ou brasas, que os índios brasileiros já dominavam tempos antes do Descobrimento.
A técnica de tempero antropológico, que atendia tanto o consumo imediato quanto o preparo de farinhas e de conserva de carnes e raízes, foi descrita por Hans Staden em seu livro “Duas Viagens ao Brasil” – o próprio Staden teria estado próximo de ser moqueado por seus captores, os tupinambás – escapou pela covardia: os índios só devoravam os corajosos.
Corajosa foi Moqueca, a bravíssima pointer de Nicola Massa. Arisca e aventureira em seus passeios, caiu em um buraco e perdeu-se por quase uma semana. Nicola convocou a vizinhança, o bairro, o mundo. Formou-se uma comunidade inteira na internet para encontrar aquela figurinha alegre, que sempre saúda, com pulos estabanados a chegada dos amigos na casa, sempre aberta aos amigos do bom gosto – e do gosto bom.
Encontrada, ele é agora festejada com… uma moqueca! É minha próxima escala na iguaria, que ganha a assinatura de Noêmia, uma banqueteira que Nicola, chef, gourmet e crítico, adotou como a melhor dessas praias. Alegria, coisa e tal, mas fica o aviso: se essa menina some de novo, eu mesmo a preparo com dendê, com ou sem moquém. Não me esqueci de explicar a passagem da moqueca pelo Chile – está na receita da chef Alejandra Faúndez, no post anterior, mostrada passo-a-passo no vídeo do Welcome Channel.
O Alentejo entra no dia em que duvidei que aquela figura que estava sentada no bar do Antiquarius era o Carlinhos Brown. O Abel, que atendia a área naquele dia, me garantiu que não só era ela, mas que ele só ia ao restaurante por causa da moqueca. Não duvidei, mas essa história da moqueca, eu quero ouvir da boca dele, como já ouvi a do Faustão, responsável pela receita, preparada com bacalhau fresco. As duas – e mais uma terceira: a moqueca de bacalhau lascado, do Antiquarius Grill – estarão no livro do Antiquarius, que, finalmente, vai sair.
Moqueca de peixe à baiana
Chef Alejandra Faúndez, da AF Gastronomia
Receita para 6 pessoas
Ingredientes:
Peixe e temperos:
3 dentes de alho socado
2g de sementes de coentro
1kg de peixe em posta, dividido em 6 unidades
Sal quanto baste.
Sumo de 2 limões
Molho:
50 ml de azeite de oliva
50ml de azeite de dendê
2 cebolas médias cortadas em rodelas
2 pimentões vermelhos médios
2 pimentões verdes médios
6 tomates maduros, do tipo débora
400ml de leite de coco
1 molho de coentro
Pimenta malagueta q.b.
Pimenta do reino branca, em pó, q.b.
800ml de caldo de peixe
50g de extrato de tomate
Modo de preparo:
Fazer um tempero com alho, sal, coentro picado e suco de limão. Misturar ao peixe e deixar descansar por pelo menos 1 hora.
Numa panela de barro aquecida, adicionar o azeite de dendê e o de oliva e refogar a cebola, o extrato de tomate, os pimentões e o tomate (reservar algumas rodelas para finalização).
Adicionar o leite de coco e o caldo de peixe e cozinhar até reduzir, por aproximadamente 10 minutos.
Temperar as postas de peixe na panela com pimenta malagueta a gosto. Polvilhar com o coentro.
Tampar e continuar o cozimento até o peixe ficar macio, por, aproximadamente, mais 10 minutos.
Retirar a moqueca do fogo e servir imediatamente acompanhado de arroz de coco e farofa de dendê.
É grande, o Pierre Galet, enólogo, ampelógrafo, autor de obras de referência para o mundo dos vinhos, como o Dictionnaire Encyclopédique des Cépages. Mas seu compêndio pode estar precisando de atualização. Em seu verbete sobre a uva branca peverella, ele fala na cepa desqualificada para os vinhos do Trentino e de sua denominação alternativa pfeffertraube (grão de pimenta) – e ainda na produção de vinhos medíocres. Talvez Mr. Galet devesse experimentar as experiências mais recentes com a uva, especialmente as que chegam na forma de rótulos brasileiros como os da Cattacini e da Era dos Ventos.
No primeiro, prevalece a fruta que a uva – uma das mais plantadas do Brasil, na época em que a família Dreher trouxe as primeiras mudas – confere ao tratamento do vinho para uma bebida mais fresca, mas com dois meses e meio em carvalho francês para arredondar e dar estrutura, segundo revela o négociant Luiz Carlos Cattacini Gelli. No segundo, o grande barato da oxidação que vem fazendo sucesso em vinhos nobres como os Gravner. O que pode soar como novidade já era, na realidade, uma revelação em rodas de degustação na França. E uma expectativa entre os especialistas brasileiros.
PERFIL GASTRONÔMICO
LEO JAIME
Os itens e os hábitos que integram o paladar de um personagem tão atuante nas artes – inclusive a da mesa
Laura Cavallieri
Leo Jaime nunca esteve tão presente na mídia quanto atualmente. Basta zapear o controle da televisão por alguns minutos para se deparar com o semblante sempre risonho e as tiradas adoráveis desse artista multifuncional. À frente de algumas das atrações mais comentadas da televisão brasileira, Leo curte a boa fase fazendo o que mais gosta: soltando o verbo. Seja cantando nas madrugadas no palco do Amor e Sexo, na Globo; atuando no seriado teen Malhação; confabulando sobre assuntos femininos no sofá do Saia Justa, no GNT; ou ainda comandando uma animada gincana entre casais, no reality show Detox do Amor, o ator-cantor-compositor-jornalista ainda arruma tempo para comer, e muito bem.
Gastrônomo assumido, circula com desenvoltura do boteco ao cinco estrelas sem deixar de lado o gosto pela comidinha caseira. Seu respeito e conhecimento pela comida garantiram participação como membro honorário na Confraria Opaboca ao lado de nomes como Vanda Klabin, Antonio Bernardo, Betty Lago e a chef Roberta Sudbrack. Roberta, inclusive, é apontada por Leo como uma de suas preferidas. Para Leo, a comida não se restringe a matar a fome. É ingrediente fundamental para compartilhar bons momentos e já foi usada como crítica social. No álbum Sessão da Tarde, lançado em 1985, sua música “O Regime (que não dá satisfação)” deixava clara sua posição sobre a ditadura:
“O cara gasta uma fortuna pra engordar
Champagne, lesma, camarão e caviar
Manhã seguinte tem ressaca e depressão
Porque a barriga cresce junto com a inflação
O problema é o regime
Que não dá satisfação”
Hoje, já sem motivos para deixar de lado os prazeres gourmets, Leo se entrega sem culpa aos ingredientes e assume: “Adoro!”.
Qual o sabor da sua infância?
Pão francês torrado direto no fogão, gemada, castelona de porco frita (as menores) com aipim cozido, arroz Maria Isabel, pamonha, pequi, coisas de Goiás.
Que prato harmoniza com um bom rock’n’roll?
Buffalo Wings com cerveja Rolling Rock.
O que já perdeu a graça na atual gastronomia?
Rúcula, tomate seco, salmão grelhado, comida pré-fabricada, molho em excesso e enfeites de pratos que não podem ser comidos.
Qual a sua receita para o dia seguinte, após uma orgia gastronômica?
Tem um remédio na França chamado Oxyboldine que é um espetáculo.
Quando acorda no meio da noite com aquela larica, o que come?
Gosto de tomar um copo de leite gelado. Para dar um pouco mais de sabor eu acrescento duas colheres de sopa de leite em pó.
Ainda está tentando entrar para a confraria OpaBoca?
Sou um membro honorário, o que muito me honra. Não sei se é possível entrar em definitivo para tão seleta sociedade, mas participar mesmo que eventualmente é extraordinário!
Se fosse criar a sua própria confraria, quais seriam as regras?
Não sou muito bom para criar regras. Talvez exigir que todos fossem Opabocas!
O que já comeu de mais inusitado?
Cabelo de milho marinado.
Tem alergia a algum ingrediente?
A música alta, restaurante muito escuro ou barulhento e a burrice.
E aversão?
Tripas, cérebro e afins. Não sou muito interessado em escorpião, olho de bicho ou coisas do gênero.
Qual é a melhor bebida para acompanhar o amor? E para o sexo?
Vinho tinto para o amor e saquê ou champanhe para o sexo.
Se comer não engordasse, o que comeria todos os dias?
Coisas que adoro, porém sem exagero ou comedimento.
Qual o seu “top 5” dos restaurantes brasileiros?
Roberta Sudbrack (Rio de Janeiro), Varanda (São Paulo), Maní (São Paulo), Olympe (Rio de Janeiro) e Paraíso Tropical (Salvador).
Pequenas preferências para grandes paladares:
“O” pastel: da feira.
“O” arroz: arroz maluco do Esplanada Grill ou do Prado, são ótimos!
“O” chope: preto da Brahma.
“A” cerveja: gosto mais das belgas, mas não sou um entusiasta.
Um vinho branco: Roero Arneis, Lá Vignée Bourgogne.
Um vinho tinto: Chateau Kirwan, L’Apparita Castello Di Amma.
Uma fruta: lichia.
Uma pimenta: dedo de moça.
Um embutido: Presunto de Parma.
Um queijo: meia-cura da Serra da Canastra ou o minas frescal feito no dia.
O café da manhã perfeito: em alguma pousada na Provence ou no Parador Lumiar, em Nova Friburgo.
Para meter o pé na jaca: Braseiro da Gávea, no Rio, ou o Nutreal, em Belo Horizonte.
Para um almoço de domingo com a família: carne assada na Pousada Alcobaça, em Petrópolis.
Para comer na praia: Biscoito Globo e Mate Leão.
Para cozinhar para a mulher: farofa, picanha no forno e batata corada.
Para dividir com o filho: picolé Itália, suco de açaí e pipoca do papai.
Para não dividir com ninguém: o bomboloni da Roberta Sudbrack.
Qual a sua opinião sobre:
Café descafeinado: adoro o da Nespresso.
Esferas e espumas: efeitos especiais não são protagonistas, mas podem compor a cena.
Azeite trufado: desconfio.
Refrigerante light: Podendo evitar é muito bom.
Degustação às cegas: aventura.
“Champagne, lesma, camarão e caviar”: – escrevi a música “O Regime (que não dá satisfação)” na época da ditadura. Hoje, adoro!
É um cervejão que me remeteu aos meus tempos de DJ. Depois da prova do BrewDog Tokyo, me lembrei de uma música pós-punk que sacudia a pista logo na abertura da noite, idos tempos de Hippopotamus. “Big in Japan”, de um grupo chamado Alphaville, que tornou-se mais conhecido por uma cafonalha chamada “Forever young”.
A música era pesada mas deliciosa, uma pancada na moleira, mas daquelas que soam como brincadeira de adolescente: dói mas é engraçado. E assim é a Intergalactic Fantastic Oak Aged Stout, como o pessoal da cervejaria escocesa conhece essa cerveja de nada menos de 18,2% de álcool – mais do que um porto.
O ataque do chocolate começa no espocar da tampa. Chegam chocolates finos, caramelo denso, tabacos, queimaduras de terceiro grau. E um terremoto de intensidade, final de café amargo pra tentar acordar após uma refeição completa, mesmo de uma garrafa só. Na boca, evoluem castanhas, com o carvalho que, finalmente, remet ao oak aged stout.
Depois que provei, li as notas de degutação. O fumeiro pode vir do toque natural de barricas de uísque.A relação com Tóquio? No idea.Mas é o meu presente de Páscoa ideal: pra assar um coelho e guarnecer com esse chocolate no copo ao lado. Brilhante cerveja.
O correto seria “me acabei no Irajá”, mas o título é uma tentativa inata de resgatar – pela última vez, espero – a velha remissão de infância, em torno de Greta Garbo, que, quem diria, acabou no Irajá. Era uma antiga peça, em eterno cartaz no Teatro Glória. Hoje, o cenário é outro. Foram duas semanas tentando uma reserva no Irajá Gastrô. Bom sinal, indicador de economia aquecida (yeah, right!) ou, pelo menos de um interesse maior pela gastronomia de experimentação. Pedro Artagão gera esse interesse desde os tempos do MAM, quando ele, literalmente, quebrou um ovo (e o reinventou) para uma pauta que fiz sobre gemas.
A Adriana, mulher do Antonio Perico foi quem conseguiu a reserva. A casa encheu cedo naquela quarta e nosso disciplinado aplomb valeu nosso conforto e uma mesa com luz para as fotos – fazer reserva e chegar na hora: normas da mais nobre cidadania que os clientes ignoram, sofrem pelo descuido cultural e depois culpam o restaurante por ser civilizado, em cartas indignadíssimas para os jornais. Mas voltemos à pauta das reinvenções. No caso do Irajá, tornam-se algo entre a já manjada (duplo sentido) reconstrução e a readaptação, passando pelo reaproveitamento. No primeiro caso, a salada caprese; no segundo, o pato; o terceiro, o pão de queijo. Tríplice coroa.
Antes disso, um instante para duas tendências e duas realidades: os couverts não são fundamentais (veio um pão caseiro, inebriante, mais por insistência – chips de mandioca com grana padano e manteiga de garrafa, viciantes, vieram como amuse bouches). E os tartares estão ficando cada vez mais consistentes. Veio o de atum com coelhada seca e azeite. Arrematando a apresentação, um belo pontilhado de teriyaki ao limão e assinatura do paladar, uma tira de abobrinha assada.
A salada caprese chegou com tomates-cereja assados lentamente, britos de manjericão e um molho delicadíssimo de mozarela fresca. O prato pedia colher. O que fez toda a diferença foi uma farofinha de croutons – pan grattato, segundo Pedro -, que deu uma estrutura espetacular à experiência. A brincadeira do reaproveitamento também veio na entrada: era um pão de queijo, no melhor estilo fofo de uma gougère. Levou empanada de tapioca e fritura leve. Foi servido com saladinha orgânica e um coulis de damasco.
Outra bela experiência veio com apelido: galinheiro completo. Era uma gema servida em cocotte estilizada e cercada de camadas de curau e canjiquinha de milho. Fundamento do tempero veio com uma redução de caldo de frango. Provada à parte, essa redução é salgada. Misturada ao conjunto (faltou essa instrução), levantou todos os ingredientes. Inclusive o próprio frango do caldo.
A leveza no paladar já tinha vindo com a caprese, o tartare e a gema. Mas subiu em outro patamar com mais uma simplicidade culinária: o nhoque (simplicidade nada- vai tentar fazer um nhoque com aquela maciez). Na guarnição, vieiras grelhadas, mas seladas de um só lado para manter a textura do outro. Veludo puro na boca, no nariz e na cobertura de alho poró. Tomei cerveja, mas um riesling faria bonito com todos os pratos. Inclusive com a gema, se a acidez contribuísse.
A barriga de porco pode ser uma espécie de calcanhar de aquiles para quem gerencia um restaurante. Como sugerir uma generosa fatia de toucinho a uma geração que começa a tremer o olho com a menção de algo próximo do que possa vir a ser gordura? Me lembrou O Jehovah, do Monty Python. Na Europa, evoluída que é na cultura gastronômica, ninguém teme (ou treme). Mas, aqui, não posso culpar o Pedro pela denominação altarnativa de pancetta. É mais simpática e vendedora, especialmente quando é prepara da lentamente, a 55 graus, no sous-vide, , para o serviço com um belíssimo feijão tropeiro e cubinhos de ovo mexido.
O capítulo das carnes encerrou-se com uma ave. O pato seria o novo bacalhau? É carne? Por mim, é. Por Artagão, também, inclusive pelo corte da gordura do magret, que foi à grelha e repousou sobre a sua versão de arroz de pato (homenagem aos convivas), com direito a um torresminho do peito e uma montagem de foie gras, algo entre um parfait e um sorbet.
Não me lembro quanto custou, não foi barato, mas foi justo – ainda não me disciplinei a guardar a nota e a mostrar a fatura do cartão aqui, como convém ao bom crítico. Mas o que fiz aqui não foi crítica, convenhamos. Apenas observações e considerações sobre o que provamos, inclusive uma das sobremesas, que me lembrou a que o Robuchon mantém há anos em seu Atelier, em Paris: uma mousse de maracujá com nuvem de manga.
E também sobre outros detalhes como o “pato x 3”, nome do prato que me remeteu à “avelã ao cubo”, de José Avillez. Se a inspiração veio daí, muito bom – o cara está antenado. Se não veio, melhor ainda – nosso Pedro é e sempre foi criativo e cuidadoso com as crias. A propósito, ele está esperando seu primeiro filho. Isso vale festa com direito a bolo de chocolate, no fim (vale um post especial por causa de uma carta patética enviada por um cliente aos jornais. Não entendi por que foi escrita. Nem por que foi publicada).
IRAJÁ GASTRÔ
Rua Conde de Irajá 109
Botafogo
Rio de Janeiro
Tel.: (+55 21) 2246-1395
www.irajagastro.com.br
Os limites do Quadrilátero de Ipanema são marcados, ao norte e ao sul, pelas águas de Ipanema e da Lagoa. A leste e a oeste, pela charmosa efervescência de um caldeirão que combina moda, estilo, cultura e paladar. Essas referências marcam também as imagens da infância, da adolescência, da vida acadêmica e comercial da empresária Cristiana Beltrão. O slogan do Bazzar, que batiza seu restaurante e a linha de produtos gourmets, que criou ao lado do marido André Paraizo, leva a assinatura “Nascido e criado em Ipanema”, um slogan que, mais do que autobiográfico, é o reflexo da influência que o bairro sempre exerceu na sua visão executiva, na sua ética profissional e, principalmente, na sua memória afetiva. O resultado de tudo isso chega agora na forma de sua eleição como Restauratrice do Ano, pelo juri da revista VejaRio. Por aqui, sem surpresas, já que essa editoria sempre a teve como a pessoa mais importante da vanguarda gastronômica carioca.
Ipanema, com afeto?
No Rio, nunca fiz nada fora de Ipanema. É onde crio meus filhos e onde fui criada, onde fiz uma das minhas universidades, a Cândido Mendes. E onde abri minha casa, onde cuido do meus negócios e onde mantenho meus escritórios. E a praia era o meu quintal, era onde meu pai (o ex-ministro Hélio Beltrão) andava, era onde eu e meus irmãos brincávamos, onde meus filhos brincam hoje.
Quais as imagens que você resgata do passado no bairro?
A praia em frente ao meu prédio. Na época, era o mais alto de Ipanema e tínhamos uma visão panorâmica de toda a vizinhança. Quando era pequena, compunha músicas para as Cagarras, para o Cristo e até para a antiga roda-gigante do Tivoli Parque. O máximo da minha ambição gastronômica infantil era ir ao Bob’s, comer um burgão com sundae, na saída da praia. Já na adolescência, usávamos blondor e bronzeador, íamos à Padaria Ipanema e passeávamos por uma Praça Nossa Senhora da Paz ainda sem muros.
O que Ipanema tem de diferente?
Tem essa coisa bacana de sempre remeter ao Rio de Janeiro dos anos 60. É uma imagem que me acompanha desde sempre, pois moro até hoje no mesmo prédio em que nasci. Ipanema é, ao mesmo tempo, charmosa, despojada e cosmopolita. Adoro loja de rua e Ipanema tem um comércio bem bacana, com um estilo sem comparação. Todos esses atributos do bairro foram considerados para montar o DNA do meu próprio negócio, para que a nossa marca tivesse esse toque cultural e vanguardista, que, pra mim, é a tradução do bairro. Além disso, a própria luz de Ipanema é diferente.
Essa luz faz diferença?
Claro! A própria idéia da arquitetura do restaurante era de fazer com que a luz do bairro entrasse e integrasse o ambiente. Por isso temos uma varanda, uma relação com a rua. Muitas lojas fazem isso. E foi uma quebra, pois os antigos restaurantes eram cópias dos franceses, fechados, sem grandes relações com o lado de fora.
E a clientela responde?
Não só responde como temos um cardápio só para a varanda. Além disso, o nosso projeto de design, assinada pela Bel Lobo, acabou ganhando, sem que soubéssemos, uma destaque na exposição Encore Moderne, no Palais Royal, em Paris, que retratava o melhor do design contemporâneo no Rio. Quem me avisou foi a Vera Saboya, que me ligou no ato pra dizer que o design do Bazzar estava entre os relacionados.
Ipanema vende bem?
Mesmo fora do Rio, as pesquisas mostraram que os consumidores são simpáticos à remissão do produto a Ipanema. Na prática, não tivemos nenhum problema com a associação e o resultado está aí: 17 produtos em mais de 400 pontos de venda em todo o Brasil. Além disso, Ipanema é um excelente mercado-teste. Se o produto não funciona na casa, não faz sucesso na prateleira. E o que funciona em Ipanema funciona em outras praças.
Quem é esse ipanemense?
É um contestador, um ser que não aceita a moda pela moda. Por isso mesmo a região transformou-se em polo da elegância discreta. Em outros bairros, o modo de ser tem mais ostentação. Claro que há a orla, mas na alma do bairro, isso não influencia. Muito desse ipanemense está na cabeça do Ruy Castro, que desenhou o charme do bairro no livro Ela é carioca.
Qual o sabor de Ipanema?
O mar faz parte do DNA de Ipanema. Desde a abertura do Bazzar, o prato mais pedido é o peixe, o que quebra a idéia da demanda global de carne com um carboidrato. Outro ícone é o suco. A questão da saúde advém da boa forma. Fruta, suco e peixe são coisas bem do bairro. Em outros bairros, já não se vê isso. E outra característica, e essa, seguimos à risca, é o do chamado “localismo”, com ingredientes produzidos a menos de 100 quilômetros do Rio.
A que lugar do mundo você compararia o bairro?
Fico com a comparação da jornalista Ana Cristina Reis. Certa vez, ela disse que a Rua Garcia d’Ávila é o Court Mirabeau de Ipanema, pois é chique como a rua de Aix-em-Provence, mas sem a ostentação das vizinhas Cannes, Nice e MonteCarlo. Por isso, entendo que marcas como a Louis Vuitton tenha escolhido Ipanema, não o Leblon como plataforma para a cidade. E você vê que a comparação não é gratuita com a quantidade de franceses que frequentam Ipanema.
Por que o investimento em arte, no restaurante?
Olha só quantas galerias de arte nós temos em Ipanema. É um bairro que, embora não tenha nenhum dos principais museus, sempre foi associado à arte. Nossa idéia é dar apoio aos artistas cariocas que brigam para mostrar a sua manifestação. Mas não é uma exposição de quadros pura e simples. Temos um painel principal, uma série de monitores na mesa, que mostra o processo de criação, e, para essa próxima, estamos prevendo também a exposição em iPads. Queremos integrar mais o trabalho ao ambiente, a partir de 2012. É o primeiro passo para nos colocar nesse rol de galerias.
Sindy Prestes é minha cunhada, casada (ou quase) com meu irmão Eduardo. Trouxe de Santa Catarina alguns exemplares, entre eles os da foto acima. Não sou fã de macarons, mas fiquei com esses, da mesma forma que fiquei com os do Hermé e do Ducasse, os do Aquim ou do Roland. Brigo, mas acabo vencido pela delicadeza de um biscoito que, em todas as fotos, já sorrindo.
Para preparar a massa dos macarons:
50 porções
Ingredientes:
110g de clara de ovo
130g de açúcar refinado
100g de farinha de amêndoas
130g de açúcar confeiteiro
Modo de preparo:
1. Em uma panela, coloque a clara de ovo e o açúcar refinado, leve ao fogo mexendo sempre, até dissolver o açúcar.
2. Transfira a mistura para o recipiente da batedeira e bata até ficar consistente. Adicione a farinha de amêndoas e o açúcar confeiteiro, previamente misturados, mexa bem.
3. Coloque o silpat sobre uma assadeira e a massa na manga de confeitar.
4. Sobre o silpat, aperte a manga de confeitar até obter um círculo de um tamanho aproximadamente de 2cm.
5. Leve ao forno preaquecido a 150ºC por 10min.
6. Diminua a temperatura do forno para 130ºC e deixe por mais 10min. ou até que a massa esteja assada.
DICAS:
Não aumentar a temperatura mais que 130ºC.
É o recheio que dá sabor ao macaron.
Peneirar duas vezes ou mais, a farinha de amêndoas e os açúcares.
Deixar os macarons secar por 30min. no silpat em temperatura ambiente.
MACARON DE CHAMPANHE
Ingredientes:
para o creme de champanhe:
365g de leite condensado
100ml de creme de leite
100g de pasta de champanhe
50g de chocolate branco
Modo de preparo:
1. Em uma panela, misture todos os ingredientes e leve ao fogo baixo, mexendo sem parar até que a mistura se desprenda do fundo da panela.
2. Espere o creme de champanhe esfriar e recheie os macarons.
“O cacho é lindo, parece um bonsai e a uva amadurece com um tom rosado na casca”. É o primeiro momento da degustação em que Pedro Silva Reis larga o sorriso sem cerimônia. Ele falava do Quinta do Cidrô Gewurztraminer, uma experiência do rótulo de vinhos de mesa da Real Companhia Velha com a tradicional casca da Alsácia e dos vinhos finos do Reno. É um antigo interesse no desenvolvimento em castas aromáticas, como a que fizeram com o moscatel galego. “Procuramos castas precoces e com aromas, fizemos um trabalho intenso de zonagem, de testes com podagens para adaptar às circunstâncias e tivemos paciência, pois demorou a pegar”, explica Pedro.
A minha brincadeira com o rótulo:
Quinta do Cidrô Gewurztraminer 2010
Douro
Importador: Barrinhas
Cor de belíssimo dourado, quase citrino, tons levemente esverdeados. Acidez notável, saliente mas nada agressiva, quase cítrico, dá estrutura para encarar pratos como curries e sushis. E, claro, a gordura de um belo leitão. O teor contribui pra isso: 13% – álcool alto para vinho branco, mas que permite um bom ano de guarda, ressalta Pedro Silva Reis. No nariz, o que se espera de um Gewurztraminer: minérios calcáreos e querosene, lichia e alguma violeta na boca. Notinha de anis dá um diferenciada. Acidez é cítrica e de maçã verde. Desce fácil, com frescor e final seco – o frescor pode ser ilusório, pois é um vinho que desce fácil e requer cuidados no entusiasmo. A garrafa segue a proposta da uva, sem máscaras: é longa como a de um belo Alsace.
Estragão é um nome forte. Dá medo a qualquer cliente que pergunte ao maitre o que leve essa ou aquele molho. Ainda mais quando se sabe que é uma erva congênere do absinto. Não é fama justa, embora o paladar levemente anisado possa levantar discussões acaloradas às boas mesas.
A palavra “estragão” é remissão direta do francês estragon, que vem do grego “drakon”, dragão, que gerou o arcaico “esdragon”. Folha de sabor intenso e festejado por sua harmonia com omeletes, aves e peixes e pela personalidade que confere a guisados e ensopados, além do excelente aroma que perfuma vinagres, nos quais são macerados, e molhos como a sauce béarnaise.
Apesar de ter suas origens nas estepes russas e nas margens do Cáucaso, foi na China e na Europa que passou a chamar a atenção, primeiro como erva medicinal citada por Plínio como poderoso contra a fadiga e pelos chineses como uma das ervas citadas no livro “Prescrições para 52 males”.
Depois, em idos do século 16, como ingrediente, e finalmente, no início do século 20, quando chegou à América pela admiração de Thomas Jefferson, como erva fina. Nos anos 70, já fazia sucesso na hotelaria, como já citado molho béarnaise e a velha guarda tem saudades da guarnição que fazia aos filés de restaurantes como o Antônio’s, o Le Bec Fin e o Antonino.
Hoje, meio esquecido, o estragão está na prateleira mais tímida das especiarias dos supermercados. Mas ensaia seu retorno dando nova dimensão a molhos para ovos e carnes brancas. Ou ainda pela criatividade de chefs como Ferran Adrià, que usou a erva como ingrediente para a sua visão molecular de um item que nos diz respeito: a caipirinha.
Fonte: A Enciclopédia dos Sabores
Ouro Negro
E cinza, e vermelho, e laranja e até verde e amarelo.
Há dois séculos, no rastro das derrotas de Napoleão, os russos invadiam Paris. Com eles, chegaria a consolidação de uma relação que dura até hoje: o amor entre os franceses e o caviar. Qualquer um estranharia um soldado com tamanha iguaria na sua ração. Mas o fato é que, antes do status de nobreza, o caviar já era vendido em feiras de Moscou. E foi servido nos bistrôs parisienses da mesma forma que nas traktiri, as tabernas russas: sobre sopa de beterraba com creme de leite.
Essa pequena introdução histórica é mais do que um marco na história do prazer à mesa. É também uma das trajetórias do paladar em torno dessa estranha iguaria, conhecidas há milênios, mas que os russos souberam salgar e conservar como ninguém, dando uma magia a mais ao ato que Inga Saffron, em seu livro Caviar, descreve com maestria: “estourando uma a uma na boca, esperando conservar na boca, por maior tempo possível, aquele sabor de riqueza untuosa e intensidade nuclear”.
O caviar acabou? Então viva o caviar. A maior de todas as iguarias já tem substitutos de quilate para manter a linhagem. Enquanto os embargos às raríssimas – e inigualáveis – ovas do esturjão do mar Cáspio se mantêm para garantir o equilíbrio das espécies do peixe, toda a indústria do paladar se mobiliza para garantir que continuemos a estalar um pouco de alegria no céu da boca. De um lado, a indústria mostra suas alternativas de uso das ovas de peixes, vindas ou não do esturjão. Do outro, os chefes criam iguarias que lembram a delicadeza da textura e a perfeição estética do caviar.
Na cozinha, a criatividade ganhou sugestões brilhantes. No Brasil, o chef Claude Troisgros surpreendeu ao levar ao seu cardápio um caviar de tapioca, que guarnece um grelhado de vieiras. Na Europa, Ferran Adriá formulou um caviar de melão, que serve em uma lata azul, no mesmo formato dos antigos caviares iranianos. Já Heston Blumenthal trouxe um caviar de chocolate, simples, posto que instigante – variação das trufas de cacau -, enquanto a Lavazza usou a técnica da esferização para fazer o seu caviar de (claro!) café.
Nos pratos cotidianos, os japoneses saem em franca vantagem. Em todo o Brasil, os sushimen já garantiram o lugar nobre das ovas no alto dos sushis. Em destaque, o caviar de salmão (ikura – do russo “ikra”, ova), que estoura na boca o toque amanteigado e a salga cuidadosa que o caracterizam. Mas a delicadeza, também, se esconde nos pequenos grãos dourados de tobiko (peixe-voador), os alaranjados do masago (caranguejo) ou os esmeraldas do umibudou, alga de Okinawa. Ou ainda no fortíssimo karashimentaiko, um prensado de ovas de bacalhau com pimenta togarashi, recomendado a paladares destemidos. Igualmente destemida é a prova do caviar branco, de escargot, lançado pela De Jaeger.
As ovas prensadas também estão chegando aos poucos às mesas brasileiras, especialmente sobre as massas italianas, na forma da secular bottarga. Produzido com ovas de tainha, salmonete ou cavala, as sacas de ovas são extraídas e tratadas inteiras com sal, antes de serem prensadas e enceradas. Já em blocos, é ralada ou finamente fatiada para servir como tempero ou petisco, já com um espirro de limão. Da praia de Garopaba, em Santa Catarina, saem, desde 2005, os primeiros lotes da versão brasileira da bottarga.
A indústria também não perdeu tempo nem criatividade. Em toda a costa leste dos Estados Unidos, a produção de caviar de esturjão, embora inferior ao do mar Cáspio, é uma tradição de quase três séculos. Além das espécies nativas, cultivam agora o esturjão ossetra, que muitos até comparam ao mais nobre de todos, o beluga. A mesma técnica vem sendo aplicada em fazendas no rio Negro, no Uruguai, e garantem a clientela em lojas luxuosas do hemisfério norte, da Petrossian francesa à Dean & Deluca americana.
Os esturjões dos rios da Lombardia e do Veneto, hoje criados em viveiros, colocam a Itália em terceiro lugar no ranking mundial da produção do caviar. Dos estuários dos rios Gironde, na França, e Guadalquivir, na Espanha, além de lagos uruguaios e das grandes bacias fluviais dos Estados Unidos, Canadá, China e Sibéria surgem promessas de bons produtos proporcionados pelas espécies locais de esturjões.
A expressão caviar pode vir do persa خاگآور, “khaghavar”, que gerou o turco “havyar”. Mas pode vir do veneziano “caviale” – Veneza foi o porto de entrada da iguaria na Europa. Dos três tipos principais, o caviar ‘beluga’ (do russo белуга), extraído do gigantesco esturjão Huso huso, é o tipo mais famoso, com grãos robustos, de até quatro milímetros de calibre, de cor cinza bem escuro, quase preto. O caviar ossetra (originalmente, осетра, também grafado ‘osetra’ ou ‘acetra’) tem o grão um pouco menor do que o beluga, a cor mais clara, tendendo ao dourado – o que lhe vale a denominação ‘royal caviar’ – e tem produção restrita ao mar Cáspio. O sevruga (севрюга), também cinzento, menor, de casca mais consistente e estaladiça tem o seu quinhão de nobreza. Quanto ao consumo, as sugestões mais refinadas sugerem que seja degustado puro (à la luxe) com um pão sem sal e acompanhado não mais do que por um bom champagne seco ou uma excelente vodca.
Dependendo das ovas – nunca as de esturjão -, algumas gotas de limão suavizam o sabor. Aplicar molhos ou ingredientes como cebolas ou ovos picados é um risco ao paladar da iguaria, cujo serviço requer cuidados. Qualquer metal, por exemplo, transfere o seu gosto ao delicado caviar. Colheres e recipientes, mesmo da mais fina prata, devem ser substituídos por recipientes de vidro ou pedras, como o mármore ou o jade (sobre gelo picado) e talheres em osso, madrepérola ou plástico, desenhados especialmente para este fim. Mesmo conservado a menos de 0°C, o caviar não dura mais do que poucas semanas e, muitas vezes, não mais de um mês, a partir da data da produção.
CAVIARES & CIA
À la luxe
Mais simples e, ao mesmo tempo, o mais lascivo dos serviços de caviar: às colheradas, diretamente da tigela ou da lata, sem censura ou pudor. Preços e escassez enterraram a técnica no passado.
Alma
De الماس, “almas”, persa para “diamante”, que denomina o caviar da empresa estatal iraniana e cotado entre os mais caros do mundo.
Alverta
Denominação específica de caviar produzido em fazendas marinhas da costa norte da Califórnia, da espécie americana de esturjão branco, do tipo transmontanus.
American caviar
Uma das respostas à obsessão dos americanos de produzir o próprio caviar, a partir de peixes de rios das regiões Centro, Sul e Grandes Lagos. Entre as matrizes, as espécies locais de esturjão, o ‘paddlefish’, o ‘bowfin’ e o ‘hackelback’, que fornecem o ‘black caviar’; o ‘whitefish’, que fornece o ‘golden caviar’ – um dos mais baratos – e, dos extremos Norte do país e do Alasca, o salmão, que gera o ‘red caviar’. Todas as variedades ganharam espaços no mercado com o embargo aos caviares russos e iranianos, decretados em 2006.
Amur
Apelação dos caviares produzidos no rio Amur, que cruza todo o norte da China e onde se encontram variedades como o kaluga, o osetra e o shasetra.
Asetra
Denominação original do caviar ‘ossetra’ nos rótulos de caviar de origem iraniana.
Avgotaracho
Interpretação de αυγοτάραχο, denominação que os gregos conferem às suas versões da ‘bottarga’ italiana, da ‘poutargue’ provençal e da ‘avutarga’ russa. São ovas secas, salgadas, prensadas e enceradas de tainhas, cavalas ou salmonetes. O resultado é uma pasta consistente, que pode ser ralada como um queijo sobre massas ou saladas ou fatiada como uma trufa, para ser degustada com pão, como um antipasto.
Avyutorga
Interpretação de авюторга. Ovas de salmonete prensadas, salgadas e enceradas, similar ao grego ‘avgotaraho’, ao sardo ‘bottarga’ e ao provençal ‘poutargue’. Como todos os demais, é cortado em fatias muito finas e servido como petisco ou tira-gosto, com algumas gotas de limão. E pode ainda ser ralado sobre saladas, sopas ou massas.
Baerii
Caviar extraído do esturjão Acipenser baerii, siberiano na origem mas hoje ambientados em fazendas marinhas de rios italianos, alemães, espanhóis e americanos. E, principalmente, em bacias como as do rio Garonne, em Bordeaux, de onde vem, hoje, a maior produção do gênero, com direito a denominação própria: caviar d’Aquitaine, de grão médio e bela cor castanha escura.
Beluga
Икра белужья, como preferem os russos, o que nos leva à pronúncia correta “belujia”, nome do esturjão de até uma tonelada, que fornece um caviar de grãos que variam de 3 a 4 milímetros, o maior – e mais caro – de todos do gênero. Tornou-se o mais prezado dos caviares durante o século XX, e a base da hoje decadente indústria do mar Cáspio, do qual se servem russos, iranianos e azeris e casaques.
Blini
De блинцы, panquequinha de massa de trigo sarraceno, de sabor muito suave e paladar macio, indicada para alongar o sabor do caviar.
Bottarga
Herança dos fenícios, que a espalharam por todo o Mediterrâneo, registrada por Rabelais em “Pantagruel”, é uma massa seca amarela ou vermelha e salgada de ovas de salmonete – atum e bacalhau podem substituí-la – conservadas em estado cremoso, em pó ou em pacotes encerados, com consistência semelhante a de um queijo. Nesse estágio, o mais comum, é servido como antipasto (Toscana, Sardenha e Veneto) ou tapa (Catalunha, Valência e Andaluzia), prato cerimonial (Córsega) ou principal (região de Marseille e portos da Tunísia). Em pasta ou ralada, compõe molhos para peixes, terrines, arroz, ovos ou canapés. Inteira e mais consistente, pode ser fatiada e servida como aperitivo com pães torrados. Na França, a iguaria também é conhecida como poutargue e, nas regiões adjacentes da Itália, como bottarga e pottarga. A rigor, todo porto pesqueiro, inclusive na Ásia e na América, têm a sua versão de boutargue a partir de ovas de peixes locais.
Denominação do caviar produzido na região de Brescia, mais exatamente na localidade de Viadana di Calvisano (em latim, “calvisius”). Lá estão instalados os tanques onde a empresa Agroittica Lombarda cria esturjões brancos desde 1980, em tanques de água de fontes aquecidas pelos fornos da indústria metalúrgica do mesmo grupo. As matrizes, presentes nos rios e estuários italianos há séculos, vêm fornecendo caviares de grãos de excelente robustez (em torno de 3 milímetros) e paladar que vem sendo posto à prova pelo mercado internacional desde 1998. No fechamento deste verbete, a deli Dean & Deluca oferece a iguaria italiana pela bagatela de 95 dólares a onça. Graças a esta iniciativa, a Itália alcançou o terceiro lugar na produção mundial de caviar de esturjão, atrás apenas da Rússia e do Irã.
Caviar de mosco
O mesmo que ‘ahuatle’. Ovos de certo tipo de mosquito,que é depositado na linha d’água de charcos, colhido e degustado como um caviar, pela forma e aparência da iguaria.
Caviar dos pobres
Tradução direta de “caviar des pauvres”, referência ao baixíssimo custo desta pasta de berinjelas, cujas sementes fazem lembrar um serviço de caviar ao creme. Clássica entrada provençal. Pasta de berinjelas, tomates, cebolas e ervas assadas e servidas como hors d’oeuvre ou como molho para crudités.
Caviar vegetal
Criação da chef Roberta Sudbrack, é uma simulação de caviar a partir das sementes de quiabo.
Coral
Diz-se das ovas de mariscos, como vieiras, vôngoles, ameijoas e mexilhões. E de crustáceos da categoria de lagostas, siris ou caranguejos. Ou o de um dos frutos do mar da moda, o ouriço do mar – o uni dos japoneses. São usadas puras, em pasta ou como corantes para molhos e manteigas.
Davidoff
Serviço de caviar servido com creme fresco e blini, consagrado como a entrada do banquete que marcou o poema “Festa de Babette”.
Hackelback
Caviar extraído do esturjão do mesmo nome, versão americana da espécie ‘sevruga’. De grãos pretos e pequenos, alcança valores no mercado bem inferiores às variedades mais nobres de caviares, como o russo e o iraniano.
Harako
De 腹子, denominação genérica que os japoneses conferem às ovas de peixe. Entre os mais aplicados nos balcões dos sushis estão os de salmão (‘sujiko’ – 筋子 – ou ‘ikura’ – イクラ), de arenque (‘kazunoko’ – 数の子), de salmonete (‘karasumi’ – からすみ), de peixe-voador (‘tobiounoko’ – とびうおのこ) e de bacalhau (‘tarako’ – 鱈子).
Ikura
Interpretação de イクラ. Ovas de salmão livres da bolsa do peixe. São prezadas tanto pelo paladar do sabor forte e da consistência quanto pela bela cor laranja-avermelhada e pela alta concentração de omega-3, tidos como importantes redutores do mau colesterol. Na cozinha oriental, guarnece massas e saladas, ornamenta belos sashimis – é o segundo no ranking da preferência entre os japoneses, perdendo apenas para o atum. Quando prensado, proporciona iguarias que se assemelham à botarga de provençais, sicilianos e ligúrios. Quando salgados ainda na bolsa do peixe, são conhecidos como ‘sujiko’, mas raramente vão à mesa neste formato. Para Richard Hosking, a expressão é derivada do russo ‘ikra’, ovas de peixe, inclusive a de esturjão.
Kaapse kaviar
Literalmente, caviar do Cabo. São as ovas de lúcio (snoek), que são salgadas em são cultuadas como iguarias na África do Sul.
Kalles
Pasta de caviar. Vendida em frascos ou bisnagas e usada como recheio ou cobertura de sanduíches e canapés, além de acompanhamentos de frios, peixes ou, de preferência, ovos cozidos.
Kaluga
Denominação internacional do caviar extraído do esturjão Huso dauricus, mais próximo do mítico beluga (Huso huso).
Karaburun
Variedade de caviar iraniano, denominado a partir do nome original (قره برون) da espécie ‘persicus’ de esturjão, do qual é extraído. Tem grãos delicados, cinzentos, sumarentos, estaladiços e, tal como os demais caviares nobres do Cáspio, atinge preços na faixa de 100 dólares o dedal.
Karasumi
Do hiragana からすみ, ovas secas de salmonete, similar à poutargue provençal, à bottarga sarda e ao avgotaraho grego.
Kazunoko
Ovas de arenque, que podem ser secas ou conservadas em salmoura e servidas em molho reduzido de ‘mirin’ e saquê. Seu serviço é um voto de fertilidade na mesa do Ano-Novo japonês, demonstrada pela concentração de mais de 100 mil ovas por peixe e pela sua denominação original, 数の子, que significa “muitos filhos”. De tão prezada, a produção local não atende à demanda e o comércio importa parte de sua oferta do Canadá e do Alasca.
Lojrom
Sueco para ovas de arenque, usado como cobertura de pães no ‘smorgasbord’.
Lumpfish
Peixe de corpo robusto como o de um pacu, mas típico do Atlântico Norte. Fornece e batiza suas ovas, que são salgadas e tingidas em negro ou vermelho. Incensadas em todas as culinárias nórdicas e se tornaram campeões de venda nos free-shops, embora seus grãos pequenos e pungentes em excesso não mereçam substituir quaisquer tipos de caviar ou ovas nobres, como a do salmão.
Madrepérola
Material ideal para a produção de colheres de serviço do caviar. Não transmite sabor nem interage com os componentes das ovas e ainda proporciona um belo espetáculo de contraste e brilho à mesa.
Malossol
Russo para “pouco sal”, a partir do francês “mal au sel”. Caviar extremamente suave por ser processado com quantidades judiciosas de sal extraído do próprio delta do rio Volga, em quantidades não-superiores a 15% do peso total das ovas. No comércio, caracterizavam-se pelas latas azuis, de valor quase equivalentes ao seu peso em urânio.
Masago
Ovas de caranguejo servidas como sushi ou feitas em pastas consistentes.
Nacarii
Uma das denominações que ganham os caviares extraídos dos esturjões do Adriático, comuns desde o estuário do Rio Pó, na Emilia Romana até a Albânia, passando por pontos entre a Croácia e o Vêneto, onde são criados em fazendas marinhas.
Ossetra
Ou ‘osetra’, ambos interpretação do original осетра, denominação que os russos conferem ao esturjão comum (Acipenser sturio), do qual extraem o caviar negro, batizado com o mesmo nome.
Petrossian
Mais famosa das fornecedoras mundiais de caviar. Espalhada pelo mundo, ganhou, recentemente, uma filial em São Paulo.
Red caviar
Referência que o inglês comercial faz ao grão grande, de belo tom vermelho-alaranjado e muito saboroso das ovas de salmão. Pode ser conservado ou prensado e seco, como é comum na cozinha oriental.
Rio negro
Denominação dos caviares de esturjão criados em fazendas no rio do mesmo nome, no Uruguai.
Presentoir
Apetrecho de exposição ou apresentação do caviar à mesa. Como convém às peças da hotelaria, são trabalhadas a ponto de se transformarem em pequenas obras de arte que superam em muito o valor das próprias vitualhas que expõem.
Salmon caviar
Uma das iguarias da moda, no romper do século XXI, são as ovas avantajadas, de belíssimo grão vermelho-alaranjado que estrela canapés, tornou-se astro de sashimis e real base de molhos finos para peixes e saladas, que ganham o salgado peculiar da iguaria. Quando prensado, proporciona iguarias que se assemelham à botarga de provençais, sicilianos e ligúrios. Quando salgados ainda na bolsa do peixe, são conhecidos como ‘sujiko’, mas raramente vão à mesa neste formato. A ciência festeja a ova de salmão pela sua elevada concentração de ômega-3, um ácido graxo que é considerado um dos elementos mais eficientes na redução do mau colesterol.
Sevruga
Do russo севрюжья (“cevrioujia”), denominação de caviar de grãos de diversos matizes de cinza fornecido pela espécie de esturjão do mesmo nome, típico do mar Cáspio. É o terceiro na hierarquia dos caviares pelo calibre dos grãos, que não superam os 2,5 milímetros de calibre, mas o sabor intenso contribui com cotações ainda elevadas no mercado, especialmente se submetidos ao tratamento cuidadoso de salga, que lhe garantirá o rótulo ‘molossol’. Por convenção, é apresentado em latas ou potes de vidro de tampa vermelha, sempre com a chancela Astrakhan, principal cidade do delta do Volga, onde os esturjões se reúnem para se alimentar de salmões jogados corrente abaixo após a desova rio acima.
Shassetra
Ou ‘shasetra’, denominação que ganham os caviares extraídos de esturjões da espécie Acipenser schrencki.
Sevruga
Do russo севрюжья (“cevrioujia”), denominação de caviar de grãos de diversos matizes de cinza fornecido pela espécie de esturjão do mesmo nome, típico do mar Cáspio. É o terceiro na hierarquia dos caviares pelo calibre dos grãos, que não superam os 2,5 milímetros de calibre, mas o sabor intenso contribui com cotações ainda elevadas no mercado, especialmente se submetidos ao tratamento cuidadoso de salga, que lhe garantirá o rótulo ‘molossol’. Por convenção, é apresentado em latas ou potes de vidro de tampa vermelha, sempre com a chancela Astrakhan, principal cidade do Delta do Volga, onde os esturjões se reúnem para se alimentar de salmões jogados corrente abaixo após a desova rio acima.
Sterlet
Denominação internacional de variedade de esturjão encontrado em uma faixa vasta, que cobre dos leitos do Danúbio aos rios da Sibéria. Menor do que os demais de sua espécie, fornece carne para grelhados e ensopados, embora os melhores resultados são os defumados. Suas ovas proporcionam um caviar de cor dourada, de grande sucesso nas cortes russas, mas inferior em relação aos similares do mar Cáspio.
Taramas
Ταραμάς, no original. Ovas de peixes como a carpa, o salmão e o bacalhau, conservados em azeite, limão e ervas, que servem como recheio de sanduíches, cobertura de canapés ou base de receitas como a taramasalata.
Tarashimentaiko
De 明太子. Ovas de bacalhau ou merluza conservadas em salmoura, condimentado com togarashi, a pimenta-vermelha em pó, que lhe dá, além do sabor, uma luxuriante cor vermelha. São prensados no melhor estilo das botargas mediterrâneas e são especialmente cobiçados pelos sushimen pelo sabor forte e picante que confere aos seus preparados à minuta.
Tobiko
De とびこ, o mesmo que ‘tobiuonoko’, ovas de peixe-voador. Tem grãos pequenos, crocantes e de cor dourada, que proporcionam sushis decorativos e valoriza pratos de peixe no paladar e na deslumbrante apresentação. Guarnece ainda massas e ensopados e proporciona refogados aromáticos, com ‘mirim’ e saquê.
Transmontanus
Diz-se da espécie de esturjão branco da Costa Leste americana (Acipenser transmontanus), que gera, além de carne finíssima, uma das modernas variedades de caviar comercializadas pela maison francesa Petrossian. Fornece ovas de grãos pequenos e levemente acinzentados.
Umibudou
Ou umibudu (海ぶどう). Não um caviar, mas uma belíssima variedade de alga marinha, que lembra um colar de contas pequenas como ovas de salmão e verdes como uvas – a comparação não é gratuita: em inglês, são válidas as denominações ‘sea grapes’ e ‘green caviar’. Pode ser encontrada em praticamente todas as águas do Sudeste Asiático, do Japão à Malásia, passando pelo Vietnã e as ilhas de Cebu e Manila, nas Filipinas, onde é conhecida como ‘araucip’. Mas, para a cultura ocidental, é tida como um dos emblemas da cozinha do arquipélago de Okinawa, no sul do Japão, que também a conhece como ‘kubirezuta’ (クビレズタ). E a consome com massas do tipo ‘soba’ ou cruas, com molhos do tipo ‘ponzu’, nunca fortes o suficiente para impedir o leve espocar dos grânulos que liberam, ao serem mastigados, uma seiva gelatinosa mas salgada como o mar.
Vem de Piracicaba uma das cervejas que pesquisei para a matéria no Caderno Ela Gourmet, do Globo, sobre I.P.A. É considerada a melhor da linha da fábrica, que está completando três anos de existência e produz 60 mil litros de cervejas, divididas em estilos mais frescos, como a pilsen e a weissbier ou mais consistentes, como a stout e a munchen.
Abaixo, as notas da minha degustação – duas garrafas, em dias diferentes – às quais adiciono a sugestão dos mestres da fábrica: o serviço com carnes defumadas ou queijos como o grana ou o parmesão.
Dama Indian Lady
6,5%
Cerveja Escura tipo IPA
Cor âmbar, límpida, clara, brilhante.
Nariz de casca de limão, evolui pra compota de abacaxi.
Boca acompanha o nariz e ainda contribui com uma nota de cereais com um toque salino Corpo médio no início, parece que cresce na seqüência, quando a temperatura sobe: o fabricante recomenda pelo menos 8 graus no serviço em copo do tipo ‘pint’.
A expressão “okanagan”, uma das diversas línguas indígenas do faroeste canadense, é interpretada como “povo que vive onde se vê o topo”. Coincidência ou não, foi em OK Falls, em Okanagan Valley, na Columbia Britânica, mais calmo e ermo das províncias desse belíssimo país, que surgiu a idéia de se olhar para o alto das vinhas da região – e, ao mesmo tempo, para o olimpo do rock.
A hipótese é uma barra forçada por mim para associar passado e presente, em uma articulação que aconteceu de fato, para um lançamento de uma das vinícolas locais, a Ex Nihilo (latim para “no meio do nada”), com a Celebrity Cellars, do empresário californiano Martin Erlichman.
O resultado foi a criação de um dos rótulos da marca Rolling Stones: o Ex Nihilo Sympathy for the Devil 2004 Pinot Noir Icewine Limited Edition , que chegou em 2008, com direito ao linguão pra fora, e é, hoje, é uma raridade de colecionador, – assim como os vinhos que a Celebrity Cellars já tinha em Napa Valley, o Satisfaction, e o vinho canadense que se seguiu, o Icewine Riesling.
Detalhe: a ação não só é oficial e autorizada pelo grupo como eles mesmos participaram das reuniões do conceito dos primeiros rótulos, que envergam a língua . “O difícil foi reunir a turma de uma só vez”, comentou Jeff Harder, proprietário da Ex Nihilo, que conseguiu fechar o formato durante uma turnê dos Rolling Stones na Bélgica. E, para quem não sabe, Sympathy for the Devil é uma das músicas mais ácidas do grupo, uma releitura de Baudelaire, segundo Mick Jagger, mas pela qual a banda foi acusada de satanismo.
O contraponto pode vir com a santificação de uma das descobertas mais recentes do mercado: o icewine, um vinho de maneiras antigas, doce, passificado pelo gelo de regiões em que a colheita é feita a temperaturas de 8 graus negativos, como é um caso desse rótulo. Curiosamente, o Sympathy 2004 não é um vinho alcoólico – 12% -, o que contraria não só a intensidade do grupo, como também a natureza desse vinho, que é naturalmente concentrado em açúcares e, portanto, em álcool.
Na época do lançamento, o preço sugerido era de 125 dólares, mas os colecionadores podem não concordar, especialmente aqueles que seguiram a recomendação dos 8 a 10 anos de guarda. Passas e frutas vermelhas frescas dão as notas de nariz e boca desse “blanc de noir”, em experiência com o pinot noir que eu gostaria de experimentar. Afinal, “I’m a man of wealth and taste”…
O mel é conhecido em hebraico como devash (דבש). E está presente em todas as celebrações judaicas à mesa, não somente a do Rosh Hashanah, que acontece nesse fim de semana, como também no Hanukkah, no Shavuot, no Purim e no Pessach. Nesta celebração de ano novo, está na liturgia, cobrindo maçãs, simbolizando o voto de doçura no ano que entra.
E está no cardápio do jantar que se segue ao cerimonial, na forma do lekach – o bolo de mel alemão que trago aqui, em duas versões de confeiteiros, uma do Kurt, outra do The Bakers, depois de ter lido no Cader no ELA Gourmet, do Globo e ficado com invejinha.
Bolo de Mel
The Bakers:
Ingredientes:
Rendimento 1 bolo de aproximadamente 750g
50ml de mel
200g de farinha de trigo
300g de açúcar
1 colher de café de cravo
1 colher de café de canela
15g de nozes
10g de passas
10g de bicarbonato de sódio
4 ovos
200g de margarina
80ml de chá preto
Modo de preparo:
Bater o açúcar e a margarina até virar um creme
Adicionar os ovos e alternar com o chá e os outros ingredientes.
Untar uma forma redonda (aro 20) com óleo e farinha de rosca e colocar os ingredientes batidos dentro dela
Após assar por aproximadamente 50 minutos em forno médio (180 graus)
Bolo de Mel
Kurt
Receita para 12 ou 15 fatias:
Ingredientes:
4 gemas
4 claras
200 g de açúcar
200 g de mel
1 colher de sopa de óleo
125 g de farinha de trigo
50 g de nozes picada
50 g de passas
Modo de preparo:
Bater todos os ingredientes menos a clara até fazer uma mistura homogênea.
Àparte, bater as claras em neve e juntar a mistura pronta.
Untar uma forma de redonda pequena de 24 cm de diâmetro com manteiga
Manter em forno médio até dourar e assar.
Quando alguém lhe disser “shana tová”, o “feliz ano novo” judaico, agradeça e retribua. Mas se alguém disser “shana tová umetucá” (ou שנה טובה ומתוקה, em bom hebraico), compartilhe. No bom sentido, claro, pois a expressão é o que o catolicismo nos priva no fim do ano, mas os judeus celebram: o prazer do voto de um feliz – e doce – ano novo no Hosh Roshaná, que acontece nesse fim de semana.
Nessa área, o simbologismo da mesa judaica não deixa por menos, com a presença das tâmaras, do mel e da maçã. Mas com o encerramento da liturgia dos pratos descritivos, o barato é cair dentro das doçuras. Uma delas, o chocolate, é novidade para os puristas, mas é mais do que um desejo; é uma garantia de se não um ano, uma noite doce.
Para a mesa ou para presente, vale conferir as duas partes dessa programação com uma adorável descoberta no Shopping da Gávea, a Katz Chocolates. Para a data, eles prepararam bombons e brownies com símbolos judaicos, como a torá (o livro sagrado), a menorá (o candelabro de sete velas), a letra chai (vida – na foto acima) e, claro, a estrela de Davi.
Katz Chocolates
Shopping da Gávea
Rua Marquês de São Vicente 52, 1º Piso
Gávea
Tel.: (21) 2249-3500
Aberto todos os dias, durante o funcionamento das lojas do shopping.
Virou uma versão estilizada do Morro Dois Irmãos, daqui do lado. Mas o exercício do fotógrafo mirim durou pouco – os modelos, idem: fofos e bem recheados por dentro, cascas morenas e quebradiças por fora, eram os pães de gergelim (esquerda) e azeitona (direita), do Guy, um misto de pão com bistrô na Fonte da Saudade.
Tinha, mas não acabou. E como tinha, me acabei. Grande Elba.
Tiramisù
Chef Luca Gozzani
Ingredientes para 4 pessoas
400 gr de mascarpone
6 ovos
200 gr de açúcar
Biscoito tipo savoiardo 10 unidades ou os artesanais
50 ml de café expresso
10 gr de cacau em pó
50 gr de chocolate amargo ralado
20 ml de vino marsala
Biscoito:
100 gr de clara de ovo montada a neve
60 gr de açúcar
80 gr de gemas de ovo
40 gr de farinha
Presa de sal
20 gr de açúcar
Modo de preparo:
Bater gemas com açúcar e o sal.
Em seguida, acrescentar a farina e depois as claras.
Cozinhar para 10 minutos a 160 graus e pulverizar com açúcar em pó
Creme de mascarpone:
400 gr de mascarpone
6 ovos
200 gr de açúcar
Bater as gemas com o açúcar até ter um composto espumoso. Em seguida, acrescentar o queijo e as claras do ovo, previamente batidas bem forte.
Montagem:
Molhar os biscoitos com a mistura de café (50 ml) e o vinho marsala (20 ml). Acrescentar uma camada do creme, polvilhar o cacau em pó e o chocolate amargo ralado. Em seguida fazer mais uma camada igual a essa.
Uma pitada de antologia na mesa: o velho está sentado, impaciente. Charlie Chaplin, com seu aplomb habitual, examina o ponto do preparado na panela e pede mais dois minutinhos até o ponto ideal. É um sapato – o próprio -, que ele serve na travessa e prepara para trinchar. O cordão, ele separa, levantando com a elegância de uma massa bem preparada.
Como exige a etiqueta, ele extrai as espinhas (os pregos da sola) como em um maitre d’hotel e seu linguado à meunière. E começa a degustar a sola com os dedos, como manda a etiqueta. Ele e o companheiro degustam a sola para a diversão e a aflição de quem assiste a cena de “Corrida do Ouro” (“Gold Rush”), desde que foi lançada, em 1925.
A cena não seria possível sem o ingrediente daquele couro negro mas bem borrachudo. Era puro alcaçuz, expressão que chegou a nós pelos árabes e seu “arq alsws” (عرق السوس) – ou o licorice inglês – do latim “glycyrrhiza”, usada pelos botânicos para denominar a planta de origem da especiaria. Foi uma encomenda feita à empresa American Licorice, de San Francisco, a mesma que viria a lançar os licorice snaps que, hoje, oito décadas depois, integram o cardápio de Harry Potter.
“Droga superior” para os chineses, a cura para a tosse para os egípcios. Pelo menos para Tutankhamon, em cujo túmulo foi encontrado um jarro dessa leguminosa de raiz doce, cuja essência serve hoje à confeitaria como substituto do açúcar. Quanto aos seus benefícios à garganta e à voz, Plínio já fazia suas loas e, hoje, a moderna indústria do fumo faz uso largo de suas propriedades ao misturá-lo ao tabaco.
Na alimentação, sempre foi usado para condimentar doces, balas e refrescos, inclusive os que os soldados franceses tomavam na Primeira Guerra. Em todos esses casos, imprime às receitas um tom pungente e refrescante, semelhante ao do anis, principalmente em pastilhas e em balas elásticas. Uma delas foi moldada como sola de sapato de nossa cena.