Feijoada à mineira
Carlos Drummond de Andrade
Uma velha e perfeita cozinheira a quem pedi a fórmula sagrada
Da feijoada à mineira,
Mandou-ma. Ei-la: “Receita de feijoada –
Tome coisa de um litro de feijão
Preto, novo, sem bicho,
E, depois de catado com capricho,
Jogue no caldeirão.
(Com feijão que não seja preto é à toa
tentar fazer feijoada.
E se teimar, não cuide que sai boa;
Sai não valendo nada.)
Quando estiver o caldeirão fervendo
Ou antes, deite o sal,
As mãos de porco, orelhas e, querendo,
Focinhos e rabo; isto (está claro) tendo,
Porque não tendo é o mesmo, não faz mal.
Se, além desses preparos, deitar nela
Linguiça e mais um osso de presunto,
Só o cheiro da panela
Faz crescer água à boca de um defunto.
Eu já ia me esquecendo (que memória)
Da carne seca e da couve.
Feijoadas sem elas, qual! É a história…
Não há nem nunca houve.
Depois de tudo bem cozido, a ponto,
Machuque bem um pouco do feijão
E pronto.
Mas machuque só a parte que senão,
Em vez de feijoada sai pirão.
Eis, aí está o prato preparado…
Minto: falta ainda o molho
Que embora simples é o segredo o escolho
De muito bom guisado.
O molho faz-se com vinagre, ou então,
(Para sair a coisa mais completa)
com suco de limão
e bastante pimenta malagueta.
Sal, ponha quantum satis.
Não vai ao fogo nem ligeiramente,
Exceto se levar também tomates,
Cebola, ou outro que tal ingrediente.
Co/a feijoada, a clássica, a mineira
É compulsório o uso da farinha.
Como bebida, um trago de caninha.
Há quem regue o vinho; mas é asneira.
Quanto à caninha fala-se
Ou não se fale, a mim é indiferente.
Eu tenho a firme opinião que um cálice
Nenhum mal faz à gente.”
Eis aí a receita.
Publico-a sem responsabilidade.
Experimentem, se sair bem feita
E eu, no dia, estiver nessa cidade…
Não insinuo nada:
Apenas lembro que ninguém rejeita
Convite para almoço de feijoada.
Carlos Drummond de Andrade
Já passou, mas vale o registro. Soa kitch, mas vale o destaque. O fato é que o design e a tecnologia funcionaram mais uma vez a serviço da descontração do champanhe. Dessa vez, na forma de um origami, que se transforma na Clicq’Up, um balde em papel-cartão reutilizável até 4 vezes, a partir de uma placa que vem acondicionada à caixa com a garrafa.
O projeto é do designer belga Mathias Van de Walle, conhecido por uma gama de objetos e móveis para decoração de interiores. Não por coincidência, portanto, o lançamento foi realizado no Salão do Móvel de Milão, o maior do mundo no gênero. A idéia da venda no Brasil seria para o Dia dos Namorados, mas vale para o ano todo, especialmente pela durabilidade do produto, que é eterno enquanto dura.
Me dá um certo nervoso ao ver algumas pessoas circulando o dia inteiro com a mesma garrafa de água, abrindo, volta e meia, e dando goles naquela caldo já quente dos verões cariocas, que começam em dezembro e duram doze meses. Passo do nervosismo à tristeza quando é uma dessas garrafas tipo minalba. E mergulho na depressão quando a opção é a dessas plásticas, com canudo e patrocínio de energéticos.
Isso não é desabafo: é constatação. E contraste estético, especialmente. Já tinha pensado nisso quando a Pantone lançou a sua linha de isotônicos. Conceitual, ainda, mas de bom gosto. E o caso voltou à minha cabeça quando vi, nas coberturas de imprensa do Fashion Rio e do São Paulo Fashion Week. Tanto nas passarelas quanto em torno delas, ou nos bastidores, notei umas pessoas carregando o Kor Water.
O desenho do estúdio RKS, da Califórnia, é avançado, instigante e de efeito irresistível, pelas cores injetadas do tritan, um polímero usado pela transparência e pela resistência, além de ser livre de componentes condenados como o bisfenol A, o temido b.p.a. As vendas no Brasil são feitas pelo site da empresa, em formatos que vão dos 500 ml aos 750 ml e valores que, dependendo do modelo, vão de R$ 60 a R$ 89.
Há duas promessas da empresa. Uma é a de manter a água saudável, tanto pela segurança das tampas, que separam os compartimentos, quanto pelo princípio bacteriostático dos materiais.
A outra promessa, coerente com a natureza do produto, é o destino de 1% das vendas para entidades como a Summit Series e a Nature Conservancy, dentro da filosofia do selo que a própria empresa mantém como missão humanitária: a Thirst for Giving. Em resumo: preocupações ecológicas, caridade e saúde podem vir com mais estilo e menos espírito bagunceiro e mau humorado das entidades que, sem trocadilhos, se arvoram a defensores do meio ambiente.
Gnocchi di papate dorati alla Mediterranea
Do chef Luca Gozzani
Ingredientes:
Para a massa:
500g de batata
150g de farinha de trigo
2 gemas de ovos caipiras
30g de parmesão ralado
10g de sal
Noz moscada e pimenta ralada a gosto
Para o molho:
240g de lulas em carpaccio (congeladas e cortadas na máquina de frios em fatias bem finas)
Puxar em 2 colheres de sopa de azeite de oliva
1 colher de chá de azeite de alho
140g de tomate concassé
8 fatias de peperoncini fresco
65g de espinafre cozido (folhas inteiras)
Sal e pimenta a gosto
16 unidades de vieiras grelhadas
Decorar com folhas de salsinhas frescas
Modo de preparo:
Para a massa:
Misturar todos ingredientes na mão até dar o ponto e cortar em formato de nhoque.
Para o molho:
Dourar o nhoque com manteiga na frigideira de teflon, puxar a lula em outra frigideira com azeite, após dourada, colocar sal, pimenta, vinho branco, tomate concasse e espinafre cozido, sobe o molho colocar a vieira grelhada e o peperoncini fresco.
O correto seria Comfort Zone, mas como esse site é uma zona, ficamos com o conforto do paladar do mais novo hambúrguer especial, da série de assinaturas e homenagens, com os quais o Joe & Leo’s marca seus aniversários e outras datas que valham a parceria entre carne carne com o pão pão, queijo queijo.
O novo componente da turma é o comfort burger, assinado pela chef Roberta Chiasca, para comemorar os 18 anos da casa. Um belo hamburger steak de patinho, com uma cobertura no melhor estilo de um bife acebolado, com cubinhos de bacon e alho frito.
Para os adultos, o indicado é acompanhar o Comfort Burger com o chope da Heineken, que a casa oferece às canecas. E com moderação, especialmente se o comensal for um blogueiro, que escreve todas essas sandices sob o alegre efeito de um bom sanduíche.
“Delightful”. É o que diz o mega-crítico inglês Oz Clarke a respeito desse riesling do produtor alsaciano Marcel Deiss, a quem se refere como um fanático por terroir, tal como consta na versão mais recente de seu guia Pocket Wine Book 2012.
Notas de lichia se combinam com os típicos toques minerais da uva riesling nesse terroir da região de Bergheim, para muitos o de maior personalidade na França. O Domaine Marcel Deiss está completando 18 anos de frescor de seus vinhos – pouco, se comparado com os quase 250 anos de tradição de sua família nas vinhas.
Para outro crítico, Hugh Johnson, as antigas inconsistências foram superadas pelas boas escolhas nos blends que o produtor realiza com uvas de diferentes vinhedos de suas propriedades, que, hoje já são inteiramente biodinâmicas. O terroir é também a característica, para a crítica Jancis Robinson, que já indica o consumo dessa safra, a 2009.
Depois da vodca e do vinho, a cerveja. Mais coerente com o seu perfil hardcore, a turma do grupo Motörhead diversifica a sua garrafeira e parte para a produção do rótulo Bastard, cerveja clara, em estilo lager, segundo informa o boletim da Decanter. O nome do novo membro da família remete ao disco Bastards, de 1993, em que o grupo faz a sua releitura de Jumpin Jack Flash, dos Rolling Stones. O lançamento do grupo acontece 6 meses depois da chegada do Motorhead Shiraz, produzido na Austrália pela vinícola Broken Back
Se o design italiano é encantador em todas as áreas de aplicação, da pintura de Michelangelo às curvas da Ferrari, na gastronomia, a supremacia tem obrigação de ser absoluta. Em maio, logo após o Salão de Milão, a feira maior da decoração mundial, surgiu essa instigante coleção de facas, que foram o tema de uma exposição em torno de novos conceitos do talher.
A iniciativa foi do Studiopepe com curadoria da designer Arianna Di Chiara Lelli Mami, que conceberam a coleção das facas para a marca Lorenzi e a expuseram na galeria Valcucine Milan Piave. Com o tema lama / non lama (lâmina, não lâmina), a mostra destacou os extremos do conceito do corte na cozinha, com peças que reproduziam desde as mais primitivas pedras de sílex até as mais refinadas sugestões para a cozinha moderna.
Poderoso, opulento, suculento e muito saboroso. Esse é o ‘prime rib’, um dos mais nobres cortes que os cortes americanos e ingleses possam colher de seus gados bovinos. É o corte para grelhados por excelência e o belo desenho que proporciona, quando preparado ainda com o longo osso da costela, tornou-se o ícone dos cortes de boi no imaginário popular – e a personificação das carnes em todo o universo dos desenhos animados e das histórias em quadrinhos.
A denominação prime não é gratuita. É um dos oito cortes considerados de primeira categoria pela USDA, o equivalente americano do Ministério da Agricultura. A própria tradução para o português geraria um impreciso sinônimo para “excelente”, mas certamente navega entre os conceitos de “principal” e “melhor”.
Segundo o Catálogo Brasileiro de Cortes Bovinos, publicado pela Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes Industrializadas (Abiec), o prime rib é obtido da divisão do contrafilé pela seção das massas musculares correspondentes às cinco primeiras vértebras torácicas que permanecem no traseiro.
Contando a partir do início das costelas, a partir do quarto traseiro, o corte está localizado entre a sexta e a décima e inclui seis tipos de músculos diferentes – incluindo, claro, o prezadíssimo contrafilé. A mais abundante, a do miolo quase arredondado é composto pelo espinhal dorsal e pelo longo dorsal (longissimus dorsi, o mesmo que batiza o aparelho de exercício dorsal nas academias; e pelo espinhal dorsal).
Ao longo do osso, que a etiqueta permite que se deguste à mão as porções não cortáveis à faca, há cinco músculos discretos: o cutâneo e o oblíquo, que viram uma casquinha. E, mais consistentes, o iliocostal e os intercostais exteno e interno.
Mas a melhor porção é descartada por muitos. É a porção macia, irrigada, mas irregular e menos atraente, formada pelo músculo multifídio dorsal, que contorna toda a parte maior e redonda, que é considerada o filé da peça. A proximidade com gorduras que derretem sobre a brasa transformam esse pedaço pequeno, mas incrivelmente macio e saboroso na melhor garfada de carne que existe no boi.
Para se comer bem em Londres, basta pedir o café da manhã também no almoço e no jantar, certo? Não, muito errado. Come-se magistralmente na Cidade de Westminster. Mas por trás dessa brincadeira, hoje datada, fica a máxima que ensina algo fundamental naquela cultura: o café da manhã inglês, o English breakfast, é uma refeição completa, rica, benfazeja – um verdadeiro acontecimento, que pode fazê-la, para muitos, o mais importante momento culinário do dia.
Mas é também o hábito herdeiro de um tempo em que o desjejum matinal, no tempo em que o almoço não existia, era o único combustível para as consistências do dia de trabalho. E também para estancar o frio de uma geografia sem acidentes, mas de clima tenso e de temperamento nebuloso. (Apesar de todo o tempo ruim, o inglês continua mais bem humorado do que nunca!)
O que vemos na imagem acima foi batizada exatamente assim: The English”, orgulhoso destaque no cardápio de um dos restaurantes mais adoráveis de Picadilly: o Wolseley. De manhã como de noite, a casa é um ponto de encontro de (e do) estilo, com clientes vestidos como convém à elegância inglesa, em um ambiente quase cenográfico, uma imersão virtual no quadro “Follies Bergères”. de Claude Manet. O cardápio é francófono, assumidamente, e remete ao que reinava nos anos 60, inclusive o coq au vin, o navarin de cordeiro, o daubes de boeuf e o canard à l’ orange.
De volta ao café da manhã, são 36 itens à escolha, inclusive o The English, que supre qualquer fraqueza de proteínas e pobreza de carboidratos com dois ovos fritos, um novelo de bacon frito à perfeição, salsicha branca grelhada, blood pudding (a morcela local) e outros temas que a foto fechada não permitiu identificar: tomates e cogumelos, ambos grelhados à perfeição. E red beans, uma concha de feijões avermelhados não pelo grão, mas pelo molho de tomate adocicado.
Voltar ao Wolseley para esse breakfast significa mergulhar em um Tâmisa de opções, algumas inesperadas, como o grilled kipper (arenque defumado e grelhado) com manteiga de mostarda; o fishcake com ovo pochê; o tattie scone, bolo de batatas com tomates, cogumelos e ovos fritos; e o kadgeree (arroz com salmão, de origem indiana) e o haggis com ovos fritos de pato, que devemos reservar para o momento anterior à minha execução.
Mas há também a retranca clássica, com a seleção de confeitarias finas – viennoisseries – em uma cesta de pequenos monumentos à gastronomia, sua arte: amandines, danishes, cannelés bordelais, pains au chocolat, pains sucrés e, claro, o croissant. Na manteiga, of course. No capítulo dos ovos, destaque para os eggs benedicts, preparados sobre scones e coberto com uma nobilíssima sauce hollandaise. Há também espaço para os fanáticos da boa forma: os iogurtes escolhidos, a qualidade dos cereais e o frescor das frutas vermelhas dão graça a quem não a tem.
São 14 os tipos de cafés à disposição, não incluído o que vem no pedido mais simples: com leite, na tigela, com baguete na chapa – para quem pensa que nossa média e pão com manteiga são originais. Ou uma taça de champanhe, humilde opção desse testemunho óculo-palatar. A do dia era Pol Roger, para fazer com que eu sentisse um pouco da rotina de nosso eterno ministro Winston Churchill.
The Wolseley
160 Piccadilly
Londres W1J 9EB
Tel.: 020 7499 6996
No rótulo deste belo azeite de oliva, uma informação intrigante: “2 hour fresh”. O significado é simples: depois de duas horas de espremido em lagares da Olisur, no sul do Chile, o O-Live & Co, óleo extra virgem de três tipos de azeitonas, já está embalado e pronto para ser usado.
É assim, ele chega ao Brasil através da importadora gaúcha Hannover, que ressalta a sua acidez, abaixo dos 2%, e da sua origem nobre, as encostas do sul dos Andes, no Vale de Colchagua, já consagrado como denominação de origem da maioria esmagadora dos grandes vinhos chilenos.
No corte do azeite, a badalada azeitona arbequina, matriz dos grandes azeites espanhóis e que imprime um sabor de frutas como a maçã, com travo de amêndoas e um final amargo e levemente picante, como avalia o especialista Jesus Ávila Granados.
O corte do azeite se completa com a oliva arbozana, também de origem espanhola, mas de exploração recente, especialmente no Chile e na Costa Leste dos Estados Unidos. E com a casta grega koreiniki, que contribui com o sabor frutado do azeite.
Quem pensa que o reino de Portugal e Algarves está encerrado, leia de novo. Estamos nos referindo ao livro O melhor peixe do mundo, de Fátima Moura, com coordenação de José Bento dos Santos, membro da Academia Portuguesa de Gastronomia. São 192 páginas que incluem desde um tratado sobre as costas de todas as costas portuguesas, inclusive as de ultramar, até receitas de chefs como Vítor Sobral, José Avillez, Joan Roca e Ferran Adrià.
As espécies em cartaz incluem espécies que vêm freqüentando cada vez mais as mesas metropolitanas, incluindo as espécies menos conhecidas (e tão saborosas quanto) de atum dos Açores, passando pelas redes da Ilha da Madeira, em que se encontram espécies únicas como a espada preta. Nas Fnac de Porto e Lisboa, por 38 euros.
Flagrante romântico no balcão de peixes do restaurante SeaMe, em Lisboa, durante a viagem em que a ViniPortugal levou a mim e a um bem humorado grupo de jornalistas para um tour pelos vinhedos de Alentejos e Algarves. Antes da partida, fizemos um rancho no restaurante, uma peixaria pop, parada obrigatória para quem gosta de peixes e frutos do mar.
Pronuncia-se “paiata”, uma forma simplificada de se falar em pagliata, ingrediente para corações fortes e paladares finos. Trata-se do intestino delgado dos cordeiros que nunca comeram – só mamaram. Eles são cortados e atados de forma que o seu conteúdo, o leite coalhado da digestão, ganhe a consistência de um creme que lembra o molho do mais refinado estrogonofe.
A carne em si não tem o paladar forte dos miúdos comuns. Pelo contrário, lembram gentis iscas de frango na brasa.
No restaurante Armando al Pantheon, do post anterior, é servido com torradas. Mas nos livros de receitas dedicados à culinária típica da cidade – a cozinha de Roma é uma coisa; a do estado do Lazio, é outra; a italiana, uma terceira; a que conhecemos, uma quarta – a pajata é servida com rigatoni. Fiquei devendo essa prova.
A pajata do post acima é mais do que uma especialidade da região do Lazio, onde prevalecem as iguarias à base de abbachio, o cordeiro de leite. É um caso do monumento da arquitetura culinária de Roma, um requinte que mora em seu endereço único: a simplicidade. E é também um dos destaques do cardápio de uma concorrida trattoria do centro de Roma, a Armando al Pantheon, que fica a alguns passos do famoso templo aos deuses do antigo Império Romano, que batiza a área e desse restaurante, que celebrou, no ano passado a conquista de uma das credenciais que a história exige: meio século de existência.
Antigo Império. Pois é. É isso o que se imagina de uma Roma de tradições afloradas em pedras seculares, em que se cumpre roteiros milenares, todos cravados no mármore dos guias modernos, que admitem pouco – ou nenhuma – variação sobre o que se pode ver além de coliseus e piazzas, fontanas e vaticanos. A mesa, assim como a vista, também não conta com guias que mostram o que há de realmente monumental na cozinha de Roma.
Os pratos chegam no centro da mesa, servida pelo próprio Armando, em porções generosas, que podem ser pedidos à la carte, em porções mais ortodoxas, individuais. Ali, o paladar monumental da cidade começa a ir além das ruínas de pizzas rápidas e fettuccines de carnaval. Com o riso nero de gambero e agrumi (arroz negro com camarões e cítricos), entramos nesse delicado panteão gastronômico de Roma: as laranjas, que dão um travo de acidez e doçura ao prato. Outro elemento imortal, a tinta de lula, que tinge o prato confere uma untuosidade que é quebrada pelo veludo do camarão e pela ação gentil das laranjas avermelhadas, conhecidas como taroccos.
O passeio pelos monumentos prosseguiu com uma curiosa forma de sanduíche, a linguaccia romana, preparado com um pão redondinho, o tozzetto, típico do Lazio. No recheio, favas e guanciale, uma fatia grelhada da papada do porco que, apesar da semelhança física, não tem nenhuma relação com essas tristes ripas gordurentas, às quais convencionamos denominar como bacon.
E a seguir veio a própria pajata, do post acima, que foi disputada com contido interesse na prmeira garfada – e com explícita avidez, a partir da segunda. O Trebbiano d’Abruzzo que abrimos, mineral no início e de levedos fortes na evolução, sustentaram não somente a complexidade do primeiro prato, mas dos que vieram a seguir. Antes, nos deliciamos com a segunda metade de uma garrafa magnum de um Gravner Ribolla 2001, uma pinçada de mestre do nosso arqueólogo-chefe, Alexandre Lalas, na rápida passagem que fizemos na Enoteca Il Goccetto, que vai merecer post próprio, mais adiante.
Mas o caminho pela nossa via appia gastrô prosseguiu na grandeza da humildade. E não é deboche, pois o que chegou foi um prato aparentemente básico, de massinha tubbetti com mais guanciale, dessa vez em cubinhos crocantes, e polvilhada com queijo pecorino. Nosso tribuno, Nicola Massa, explica o caminho dessa simplicidade: é um prato que marca o movimento da transumância, em que pastores, bagagens e rebanhos migram para o alto da montanha, durante o verão.
Não sei se o melhor deixam para o fim – foi realmente difícil eleger o melhor da série. Mas chegou o chamado abbacchio brodettato, um ensopado riquíssimo de cordeiro, que é estufado em um caldo consistente (diferente dos brodos, que costumam ser claros), preparado lentamente com ossos, carnes e condimentos como cravos e canelas, bases como tomates, cebolas, aipos e cenouras, cheiros como a manjerona e a hortelã local (mentuccia romana). Garfo e faca estão ali, mas recomendam-se outros dois talheres: mãos para as carnes. E colher para o molho e o feijão (fagioli di Viterbo), que também podem ser raspadom com um dos pães que vieram à mesa: o bruschello.
Os baci di dama, finíssimos chocolates oferecidos na saída, não cabiam mais na memória. A rigor, pouco caberiam na história vivida naquela mesa, em que cada prato conta a trajetória de um rito, de um apuro, de um carinho, todos tão próprios de uma Roma risonha à mesa.
Há uma outra visão sobre a degustação, essa muito mais sensível do que a minha, no texto de Cristiana Beltrão.
Armando al Pantheon
Salita dei Creschenzi, 31
Roma
Tel.: 06.68803034
Os vietnamitas são iguais a nós e também têm direito a seu Dia dos Namorados. Para celebrá-lo, a sede da agência Bates, em Hanói, criou essa peça para a Heineken, em 2006. Ok, a veiculação aconteceu em fevereiro, data internacional do Valentine’s. Mas vale como mais um ato de simplicidade criativa, associando a boquinha da garrafa com o anel de noivado.
A Stoyn não é uma sorveteria russa. É um estúdio de criações em design sustentável. Ou “Experimental Ambiental Agency”, como eles mesmos se definem. Enfim, são criativos o suficiente para criar uma linha de picolés com formas de cabeças célebres, entre elas a do aniversariante do mês, nosso ícone do mal, o retrato de nosso dark side, Darth Vader.
Mais do que uma idéia genial, temos aí um conceito irresistível, especialmente quando nosso herói chega em uma inesperada combinação de sabores: blueberry e alcaçuz, desenvolvida por uma empresa parceira, a DolceBaci, de Moscou, essa sim, uma sorveteria.
Esse e outros modelos consumistas como Marilyn Monroe (morango e creme de leite), Vladimir Maiakovski (vodca e cranberry) , Super Mario (tequila sunrise) e – ícone maior do capitalismo – Che Guevara (mate e rum) fizeram aparições recentes, em eventos de arte de Miami, como o Art Basel e o Fountain Art Fair.
Como a tiragem é limitada a esses eventos, só nos resta esperar quem vai ser o primeiro a fazer o que mais estamos acostumados: copiar e colar.
Há 75 anos, Henri Matisse lançava o livro Jazz. Inicialmente, seria um livro de ilustrações sobre poemas. Mas a obra cresceu e tornou-se um autêntico catálogo de obras inéditas do pintor francês. E uma pequena bíblia da arte modernista.
E uma viagem de abstração.
Colagens, modernismo, abstração, e, principalmente, viagens e poemas, é o que sempre se vê na obra do chef Tsuyoshi Murakami. E é o que se espera no livro Kinoshita e o Jazz de Murakami, que o chef acaba de lançar pela editora BEI (252 páginas, 150 reais).
Viagens, são duas: uma ao Japão, que resultou no vídeo do cineasta Marco Aslan (em CD anexo) e na narrativa do jornalista João Gabriel de Lima. A outra, a da própria trajetória do sensei e de seu restaurante, na Vila Nova Conceição.
É ali, no balcão do restaurante, que se tem idéia da ligação entre Murakami e Matisse, através das criações modernistas das inúmeras colagens que faz em suas criações, que estão um jazz à frente do que se espera de um sushibar, seja em termos de vanguarda de suas criações – ou nas poesias de suas tradições.
Kinoshita
Rua Jacques Félix 405
Vila Nova Conceição
São Paulo
Os pratos de camarão do Ceará podem ganhar novo status. No fim de abril, a União Européia registrou o pleito daquele que pode ser a primeira Denominação de Origem Protegida do Brasil reconhecida no Velho Continente: o camarão da Costa Verde.
Produzido no Ceará, na faixa de costa que vai de Cruz a Jericoacoara, 200 quilômetros ao norte de Fortaleza, o camarão já tem, desde agosto do ano passado, a sua denominação de origem reconhecida no Brasil.
A região é dita Costa Negra pelo aluvião rico dos rios da região, que levam os nutrientes que dão a consistência e o paladar distinto deste tipo de camarão.
Um dos lançamentos da temporada dos livros de gastronomia é o livro Blumenthal at Home. O livro não é só uma produção a mais na vida do chef. É também um marco em seu estilo, que deixa pra trás os extremos da cozinha molecular para se apegar aos clássicos que tanto explora em seu programa de televisão.
Esse novo estilo é também a linha de seu novo restaurante, o Dinner, no Mandarin Hotel, em frente ao Hyde Park, que já está entre os nove mais votados do júri da da revista inglesa Restaurant.
Tanto na casa nova quanto no livro, receitas fáceis, ao longo de mais de 400 páginas, em que a exigência maior está na qualidade dos ingredientes. E por apenas 13 libras, via amazon.uk. Em tempo, o Fat Duck, seu restaurante de vanguarda, que já foi o mais cotado do mundo, desabou para a 13ª. posição na tal votação.