Declaração de Amor

[8 jun 2022 | Pedro Mello e Souza | Sem comentários ]

Mais uma reedição de uma das minhas colunas favoritas, que sempre dedico aos namorados – e a seu dia. (Reprodução)

 

Uma amiga me perguntou qual vinho eu escolheria para conquistar alguém. São tantas as respostas. Depende muito do momento em que a relação está. Pode vir na forma de um vinho em torno de um primeiro jantar à luz de velas, no qual o rótulo só importa se for ruim. Pode vir de um belo sauvignon blanc para acompanhar a dúzia de ostras, quando a intenção afrodisíaca é ir direto ao ponto. Mas é como diz Ducasse, em seu Dicionário Amoroso da Cozinha: a melhor harmonia do vinho é aquela que a gente se lembra, a que fica na memória. E não importa se é na hora do primeiro beijo ou dos 50 anos de um casamento.

 

Pessoalmente, não vejo sentido na expressão “harmonização”, pois a maioria delas é bem esquecível. Mas, em tempo de namorados, valem os equivalentes que vêm do inglês “pairing”, formar um par. Ou do espanhol “maridaje”, ainda mais romântico e casamenteiro quanto nosso Santo Antônio, que celebramos no dia 12 de junho. Mas vamos a exemplos para cada estágio.

 

Para quem ainda duvida de que amizade é quase amor, o brasileiro Amitié é pura declaração de “amour” (Foto Pedro Mello e Souza)

No primeiro desses estágios, uma expressão com selo “mais brasileira, impossível”. É o inegável e adorável adágio popular “Amizade é quase amor”, que gerou variações como a carnavalesca “Simpatia é quase amor”. E falar em amizade, é falar em amizade é falar em “Amitié” – e quem conheceu a linha dos vinhos, especialmente dos espumantes, das amigas Andreia Milan e Juciane Casagrande, que tomaram o mercado com simpatia e, pelos volumes dos dois últimos Dias dos Namorados, quase amor. Depois do brinde, a declaração será natural.

 

Arte e romance no rótulo do Muac!, com o calor de um beijo das Ilhas Baleares (Foto Pedro Mello e Souza)

Os vinhos tintos da vinícola Anima Negra podem ser um bom começo. Vêm de Mallorca, vizinha de porta de Ibiza, e são mais do que quentes. São “calientes”. As uvas, mais do que desconhecidas, soam misteriosas como a “manto negre”, em corte com a “callet” e um beijo rápido de cabernet sauvignon, está no rótulo da Muac!, decorado com outro ícone do desconhecido e do misterioso, o primeiro beijo: o com dois namoradinhos em estilo desenho animado estampando um selinho, criação do artista catalão Pere Joan.

 

Do Douro, o Apaixonado, rosé excepcional de Plínio Barbosa (Foto Pedro Mello e Souza)

O belíssimo rosé do Douro, produzido por um brasileiro, o aficcionado e sempre apaixonado Plínio Barbosa. Acidez e frutas todas no lugar, em um vinho que refresca até sem estar gelado – recomendo quase temperatura daquilo que todo rosé no fundo é: um tinto elegante. Aqui, no Rio, chega pelas mãos do Mauricio Kaufman – nosso cavaleiro andante dos vinhos românticos para o dia de qualquer namorado apaixonado.

 

Chamar a namorada de linda é um clássico imortal. Mas não foi por recurso romântico que Luigi Bosca lançou o La Linda. É o nome da propriedade que batiza o rótulo, que pode virar um bom presente, seja na uva malbec, seja na uva tempranillo. Peça que a loja seja discreta na entrega, para que o presente surta mais efeito do que uma declaração banal.

 

Do Alentejo, um caso de amor com Dona Maria, a amante do rei? (Foto Pedro Mello e Souza)

Amantis é um vinho alentejano, um dos ícones do portfólio de Julio Bastos, produtor que assumiu e modernizou os vinhos da antiga Herdade Dona Maria. A referência do rótulo, bem no estilo amada amante, é à senhora dona Maria (em Portugal, chamar só de “dona” é ofensa irreparável) que teria “herdado” a propriedade de D. João V para ter com ele seus encontros amorosos, embora não se saiba exatamente que vinho dividiam na época.

 

Em todos os estados de um romance, as rosas são estrelas em algum momento. Inclusive os de criatividade, quando aquele buquê pode vir nos aromas de um Douro tão rico na boca quanto é sugestivo no nome: Quinta de La Rosa. Ele traz tudo aquilo que é necessário, também em qualquer estágio de um relacionamento: estrutura e uma boa acidez. Mais pétalas em outro rótulo, esse vindo da romântica La Mancha de Don Quixote, o 99 Rosas, um “maridaje” entre viognier e chardonnay, disponível no site da Casa Flora.

 

As pétalas de Castela nos rótulos do orgânico 99 Rosas. (Foto Pedro Mello e Souza)

Algo mais arrebatado do que as paixões sicilianas? Duas delas estarem rótulos que nos trazem o que Vinicius prometeu mas restringiu: a fidelidade. Ambas, em rótulos da Tasca d’Almerita. Um, da uva nero d’avola, o Lamùri, amor, em dialeto local, que de lamúria não tem nada. O outro, o Nozze d’Oro, que festeja com a uva tinta “inzolia” um extremo do amor e da fidelidade, já que falamos de um rótulo que celebra as bodas de ouro do Conde Giuseppe Tasca, patriarca da vinícola, com a sua mulher Franca. Em ambos os casos, vinhos eternos enquanto durem.