“O senhor aceita uma pimentinha?”. Cuidado com a resposta. Ela pode chegar à mesa na forma de uma queimadura de primeiro grau no esôfago. Ou nos aromas das milhares de espécies de pimentas vermelhas, descobertas com o Novo Mundo. Mas podem chegar também com sutileza de uma salpicada das pimentas do reino, veteranas das rotas das especiarias. Ou ainda sob as formas diversas das pimentas ditas falsas – sichuans, sírias, jamaicas, aroeiras – mas de paladares e calores bem verdadeiros.
Mas a escolha é mesmo difícil. A botânica contabiliza mais de 3 mil tipos de espécies, subespécies e variedades somente de pimentas vermelhas. A culinária multiplica esse número ao relacionar as pimentas conforme a maturidade, o tamanho, a secagem e até a cura, como a defumagem, ou ainda a sua apresentação, como pastas, pós, molhos e conservas.
Colhidas frescas, as pimentas nascem verdes, tornam-se amarelas e maturam vermelhas. E podem ser muito suaves ou perigosamente picantes, em níveis tão diferentes que a escala Scoville, criada para medir o calor de cada espécime, tem graduações que vão de zero a 500 mil – com estas mais fortes, algumas desenvolvidas em laboratório, o calor de uma gota só perde a sua força com meia tonelada de água.
Antes que Colombo descrevesse as pimentas recém descobertas e Cortez a reconhecesse no sabor do chocolate servido aos deuses, o mundo já baseava parte de sua economia nas especiarias, entre as quais sobressaía-se a pimenta do reino. Apicius a aplicava com parcimônia, mas em receitas tão surpreendentes quanto a de refrescos para viajantes. Os alemães a usavam para aumentar a vida útil de suas cervejas. E os franceses já faziam uso da expressão pigmentum em duas de suas artes maiores: a pintura e a culinária.
Com o trânsito intenso dos mais diferentes tipos ao sabor dos ventos da época das navegações, todos os itens classificados nas despensas como pimenta embaralharam-se mundo afora, junto com as lendas que as tornam ainda mais atraente, do aumentos dos calores corpóreos – e sexuais – às formas de combate de sua força: pão, águas, sucos e outras bebidas são ineficazes e só espalham mais a pimenta na boca.
Sem a pretensão de esclarecer as dúvidas, a relação anexa relaciona as pimentas mais famosas ou curiosas, com destaque para algumas variedades brasileiras, pouco conhecidas, mas consideradas por alguns autores como a mãe de todas as pimentas.