O dicionário das azeitonas

[10 nov 2013 | Pedro Mello e Souza | Sem comentários ]

Trilogia de azeitonas, de José Avillez, no Belcanto, em Lisboa (FOTO Pedro Mello e Souza)

Você já degustou seu azeite hoje? Não? Então faça-o antes de comer e beber. De preferência na ponta de uma colher, sorvendo com o cuidado de uma criança diante de seu xarope amargo. E algum amargor será mesmo sentido, junto a um complexo de outros paladares, aromas e uma necessária picância no fundo da garganta. Se tudo parece ao leitor uma grande frescura, essa nada mais é do que a recomendação daquele que é considerado um dos maiores entendedores de azeites e, principalmente, das azeitonas que os geram: Charles Quest-Ritson, autor do livro Eyewitness Companion: Olive Oil, tema do post Azeite, mulheres e memória.


Se não se lembrar das sugestões de Ritson, mastigue uma azeitona. Ou tome a sua colherada de seu azeite. É considerado um tônico contra a falta de memória – e, dizem os nutricionistas, um bom elemento para segurar as bebedeiras. Mas é na mesa que essa memória se revela. Mas qual dessas azeitonas deve-se provar? Pode-se escolher entre as mais de 300 variedades estão depositadas no Banco Mundial de Germoplasma del Olivo, na Universidade de Córdoba, Espanha, maior produtora mundial da planta.


Azeitonas do tipo kalamata: suculância no Bazzar Bubble Bar (FOTO Pedro Mello e Souza)

A palavra azeitona vem do árabe al’zeitoun. Quanto à sua origem e sua idade como iguaria, é citado tanto nas aventuras nos Balcãs e da Anatólia da Bíblia e da Odisséia. Além de fornecer o azeite por prensagem, responsável por mais de 80% de toda a sua colheita, proporciona uma conserva irresistível como aperitivo – famosas em Portugal, Espanha, Itália, Grécia, Turquia e todo o norte da África – além de molhos, pastas, recheios e guarnições, entre elas o nobilíssimo martini. Confere legitimidade às empadas, aos preparados à portuguesa e dos formatos alla pizzaiola. É a base de molhos como a olivada catalã e a tapenade provençal.

 

Os tipos que você ainda vai provar, em lista que estará sempre em crescimento, está abaixo – sugestões serão muito bem vindas para equilibrar o jogo, aqui muito focado em castas portuguesas, espanholas e italianas:

 

Aglandeau

De ‘gland’, glândula. Uma das principais castas de azeitona do sul da França, mais produzida e integrante majoritária das denominações da área – ‘Aix-en-Provence’, ‘Vallée des Baux-de-Provence’ e, a mais nobre delas, ‘Haute-Provence’. A variedade, junto a outras como a ‘bouteillan’, a ‘cayon’ e a ‘salonenque’, deve integrar pelo menos um terço do corte de um total de 80% de todo o azeite, que ganha, assim, seu paladar picante e seu aroma frutado e vigoroso. ‘blanquette’, ‘plant d’Aix’, ‘Verdale de Carpentras’ e ‘verdale de Vaucluse’ estão entre os sinônimos locais da ‘aglandau’ para a extração do azeite. Quando vai para a mesa, sua denominação mais comum é ‘berruguette’.

 

Agriniou

Αγρινίου, na grafia original da denominação desta apreciada variedade de azeitona curada da cidade de Agrinion, na região oeste da Grécia continental. É reconhecida nas feiras por alternar azeitonas verdes e pretas, estas já em processo de cura.


Arbequina

A denominação é uma referência a Arbeca, comarca de Garrigues, próximo à cidade catalã de Lérida, onde estaria presente, segundo Granados, desde a Alta Idade Média, trazida pelos templários ou por cavaleiros em rota de retorno das Cruzadas. Aí está o pedigree desta variedade de azeitona pequena, mas de boa produtividade, autorizada por lei na composição de azeites das DO de Garrigues, Siurana e Bajo Aragón, além do Oli de Mallorca, nas Ilhas Baleares. Proporciona azeite aromático, com produtividade de até 22%, e de alta concentração de ácido linoléico. Nas notas de degustação encaminhadas à Comissão Européia pelas autoridades espanholas, notas de maçãs e frutos maduros e uma suavidade especial pelo baixo nível de polifenóis. É plantado tambén em Portugal, na Argentina, no Chile e nos Estados Unidos.

 

Biancolilla

Mais plantada das azeitonas sicilianas, proporciona um azeite de paladar refinado e próprio para varietais ou algumas das sete denominações da ilha.


Bical

A semelhança com a uva do mesmo nome não é coincidência. Variedade de azeitona de dupla aptidão – mesa e óleo -, típica do norte de Portugal. É batizada a partir de seu formato, bicudo, embora ganhe sinônimos regionais como ‘cornalhuda’.

 

Cacereña

Ou ‘manzanilla cacereña’, mais importante variedade de azeitonas da Extremadura espanhola e única autorizada por lei a integrar os azeites da DO ‘Gata-Hurdes’.

 

Carrasca, carrasquina

Variedade de azeitona do norte de Portugal, usada tanto como petisco como para a produção de azeite. Já era citada em meados do século XVIII por João Antonio Della Bella, na relação de olivares portugueses que publicou na época. Na Espanha – e em toda a comunidade internacional -, é conhecida como ‘manzanilla de Sevilla’.

 

Azeitonas verdes: fundamento para um martini impecável, como o que o Guarabyra prepara no bar do Esplanada Grill, em Ipanema (FOTO: PMS)

Cobrançosa

Variedade de oliva apreciada pela qualidade dos cortes de azeite que proporciona e pela boa resistência a pragas e doenças. É comum em olivais de categoria, de Ribatejo e do Alentejo, e é uma das castas autorizadas para integrar azeites das DOPs Moura e Trás-os-Montes, reconhecidas pela União Européia.

 

Cornicabra

Mais importante das azeitonas produzidas da região olivareira de Castilla-La Mancha, onde é a principal casta autorizada por lei para a produção de azeites da DO Montes de Toledo. A denominação advém não da forma das frutas grandes e carnudas, mas do desenho das folhas de sua olivieira, que remetem aos chifres de uma cabra. É plantado também em Portugal.

 

Corregiolo

Variedade de azeitona que integra os óleos extra-virgens das apelações DOP ‘Chianti Classico’, DOP ‘Terre di Siena’ e DOP ‘Colline di Romagna’.


Gordeal: a azeitona escoolhida por Jan Santos para o couvert do Entretapas (FOTO PMS)

Empeltre

Principal variedade de azeitonas usadas na composição dos azeites da DO Bajo Aragón e da DOP Aceite de Mallorca. Apresenta um fruto de tamanho médio, de caroço pequeno, bom conteúdo de polifenóis e, dependendo da região em que é produzido, da Rioja às Baleares, pode ser conhecida como ‘aragonesa’, ‘terra alta’, ‘llei’, ‘injerto’ ou ‘mallorquina’. Nas notas de degustação encaminhadas à Comissão Européia pelas autoridades espanholas, notas de maçã verde e amêndoa madura e excelente fluidez de óleo.

 

Frantoio

Variedade de azeitona que compõe os azeites extra-virgens protegidos pelas DOP ‘Canino’ e ‘Sabina’, ambas inscritas em região a norte e noroeste de Roma; ‘Cartoceto’, no Marche, ‘Colline Selrnitane’, ao sul de Nápoles, ‘Garda trentino’, ‘Pretuziano delle Colline Teramane, no Abruzzo, ‘Laghi Lombardi’, ‘Terre di Siena’ e ‘Chianti Classico’, na Toscana.

 

Tapenade do Térèze, em Santa Tereza (FOTO Pedro Mello e Souza)

Kalamata

Azeitona de origem grega, da região do mesmo nome, no Peloponeso. As gigantescas e suculentas azeitonas curtidas gregas, colhidas maduras, curadas e conservadas em seu próprio azeite e aromatizado com orégano ou em vinagrete.

 

Mission

Variedade de azeitona que fornece um azeite encorpado e perfumado. O nome vem das missões da Califórnia, onde chegaram das mãos de colonos, nos idos de 1769. Não por coincidência, tem o nome das uvas trazidas pelos mesmos missionários espanhóis.

 

Picual

Casta de azeitona de frutos médios, de paladar picante e ligeiramente amargo, que traduz aos azeites que integra, especialmente na região de Jaén, na Andaluzia. É uma das variedades mais cultivados do mundo (Chile e Portugal, inclusive) e ocupa mais de 80% dos olivares do sul da Espanha e das Ilhas Baleares, onde integra, por lei, o corte dos azeites protegidos pela denominação DOP Aceite de Mallorca.

 

Verdeal transmontano

Variedade de azeitona que integra cortes de óleos contemplados por DOP Trás-os-Montes, reconhecida pela União Européia. Foi uma das variedades portuguesas citadas por João Antonio Della Bella, na relação de olivares portugueses que realizou em meados do século XVIII.

Degustação de varietais de azeitonas na Herdade do Esporão (FOTO Pedro Mello e Souza)

Fontes:

Enciclopedia del Azeite de Oliva

A Enciclopédia dos Sabores

Eyewitness Companions: Olive Oil

 

 


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