O mestre dos caldos

[7 out 2014 | Pedro Mello e Souza | Sem comentários ]

Caldo de mocotó no copinho de cachaça e a mini-baguete para molhar (Foto: Pedro Mello e Souza)

Não pude fazer nada. Foi mais forte do que eu – e do que vários outros que fariam o mesmo, mas não à minha moda, em em pleno salão do Oro. Sim, peguei o prato, levei à boca e matei o molho. A resposta veio rapidamente: em copinhos de cachaça, tipo aquelas miniaturas de requeijão, Felipe Bronze enviou mais caldo, dessa vez para degustar lentamente, sem que eu repetisse a grosseria, que, embora atacável, foi quase aplaudida.


Barriga morna de pirarucu com picles de couve de bruxelas, molho de mocotó, o objeto de toda a ocorrência (Foto: Pedro Mello e Souza)

Shave de foie gras de beijupirá, molho de açaí com pó de algas (Foto: Pedro Mello e Souza)

Em minha defesa: era um caldo de mocotó que acompanhou os cubinhos crus mas ainda mornos de barriga de pirarucu com picles de couve-de-bruxelas. Intenso, profundo, elegante e, como exige o mocotó, com aquela colinha que suja os lábios com puro paladar gordo. Veio com garfo, mas mesmo que fosse com colher, teria virado da mesma forma. E qualquer juiz me absolveria.

 

Devia ter feito mais vezes – talvez ganhasse mais caldo, mas a função era longa e o serviço poderia não vir nem com a mini-baguete para molhar no caldo nem com o mesmo sorriso da primeira grosseria. Seria explicável, pois tinha um caldo de rapadura que acompanhou o black cod. De ganir. Tinha o molho da redução da rabadinha desfiada e recomposta em um cilindro, servido com a polenta e agrião regulamentares. De enternecer.

 

Black cod com caldo de rapadura, um molho de mestre (Foto: Pedro Mello e Souza)

Rabada, polenta de agrião e o molho reduzido e reluzente na aparência, na intensidade e na elegância (Foto: Pedro Mello e Souza)

Poderia citar o velouté de açaí que acompanhou o shave de fígado de baijupirá. Ou o caldo de carne da versão de Bronze para o bife a cavalo – uma esfera de ovo com caldo do bife injetado, para que tudo estoure na boca. Mas os três que citei antes vieram em uma sequência que mostra a maturidade de um chef diante do sabor absoluto, que os chefes espanhóis tanto perseguem, intensos mas delicados, leves mas apurados.

 

Um caldo que vai á mesa não é tarefa simples. São diferentes dos fundos de cozinha que preparam antes, com horas ocultas e segredos a fio. Muitos respondem com um sorriso maroto, quando perguntam sobre o ingrediente que ele está sentindo. Responder, seria dever de chefe, mas não é nenhuma obrigação de mágico. Não dos que fazer algo sumir, mas que fazem o nada surgir.

 

 

 


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