Checando a cerveja que a Bohemia preparou para o Bar Urca. Em princípio, uma pilsen com dry hopping. Falaram vagamente em “lúpulos americanos”, que ainda não senti. Provado, é onde a Bohemia tem nos levado, a uma cerveja básica, insípida e inodora. Não só no caso dessa marca, mas de todas as demais que produz, em sistema de franquia.
Salva-se do incolor por lembrar, vagamente, o que aprendemos a provar nos anos 70, quando comprava-se a cerveja em caixa de doze garrafas, em uma das entradas para Araras. Era uma caça ao tesouro de uma cerveja de verdade, para muitos um segredo que valia a viagem, nem que fosse para subir a serra, tomar a carga e voltar para o Rio. Era um círculo de segredos para saber quando estaria disponível a nova partida. Fresca, um veludo de malte na garganta, um beijo de cereal na boca.
Muitos gourmets faziam isso: garimpar onde tinha. Mas a fase das incorporações levou a antiga Bohemia à extinção. Depois da venda, mantiveram o rótulo, mas o conteúdo passou a ser o mesmo da empresa que a adquiriu, garantiu-me um executivo, hoje aposentado, incidentalmente o maior gourmet do Brasil. A Bohemia ia para sua mesa. Hoje, não passa nem no ralo da cozinha, revelou, com seu incorformismo germânico.
Mais do que uma perda, foi uma derrota para a cerveja carioca, que, mesmo reagindo, duas décadas depois, viu sua escola em ruínas, entregue a projetos rasteiros, como esse do Bar Urca. Se é pilsen, só no laboratório saberíamos. Pode até ser dry, mas não há hopping digno da chancela. O design do rótulo é a única salvação dessa primeira leva da cerveja. Preferia que não remetesse à época da inauguração da cervejaria, em 1839. Não é justo, não é correto.
Querendo entender o porquê de um rebaixamento tão gratuito de marca outrora tão influente, enviei, via assessoria de imprensa, uma relação de dez perguntas técnicas. Obviamente, nenhuma delas foi respondida.
Mas no Bar Urca, um produto desses não faz muita diferença. Condiz com o chope da casa tão indigente quanto seu serviço grosseiro e sua cozinha de peixes com cheiro de caldo industrial – próprio, enfim, para quem suporta o cheiro de marisco vencido da murada em frente, cenário perfeito para (vou respeitar sempre os paladares superiores) os apreciadores de chope quente, dos quais estaremos livres quando buscarem as antigas qualidades, tanto a cerveja quanto o bar em questão.