Ano novo, copo novo

[30 dez 2016 | Pedro Mello e Souza | Sem comentários ]
Coluna Letras Garrafais, Rio Show, O Globo (Foto: Gustavo Bastos)

Coluna Letras Garrafais, Rio Show, O Globo (Foto: Gustavo Bastos)

Um dos sinônimos de elegância no mundo do vinho – deixemos de modéstia, no mundo inteiro – está caindo em desuso: a flûte de champanhe. Esguia, requintada, refinada, vem sendo substituída seguidamente pelos copos de vinho branco. Em alguns casos, como em degustações de grandes millésimes, até o copo de Borgonha é usado. O motivo, a tendência dos espumantes aromáticos, que exigem superfície e bojo para a concentração de suas notas de frutas, flores ou tostados, que quase não se desenvolvem devidamente em um copo de corpo fino.

 

Esta é uma das tendências que os mundo do vinho nos traz aos nossos hábitos e comportamentos. Não digo isso que seja uma promessa já para 2017, pois trata-se de uma mexida em nosso lado lúdico e, penso eu, ainda vai levar um bom tempo até que se desista de brincar de esnobe em um momento excepcional quanto a degustação de um champanhe.

 

Na realidade, esta é a segunda vez que o protocolo do champanhe é quebrado. Na primeira, as antigas taças que lembram a do martini, mas de corpo curvo, aqueles que as lendas brincalhonas garantem serem moldados pelos seios de Maria Antonieta, foram solenemente abandonadas. Mas legaram à língua portuguesa a expressão “taça”, a partir do seu nome original, coupe, copa, antes de dar lugar às mais alongadas, as flûtes, flautas.

 

Hoje, as poucas coupes que ainda existem estão esquecidas em cristaleiras da casa de algum antepassado empoeirado. Ou lembradas em filmes como “Os Intocáveis”, quando Al Capone brinda com o tenor da ópera “Pagliacci” com uma dessas taças, que ele retira de outro hábito que sumiu, uma cascata de champanhe, na cena logo após a ária “Vesti la giubba”, em uma das sequencias mais espetaculares do cinema. Mas podem ser rapidamente resgatadas, como no copo que Karl Lagerfeld criou para a Dom Pérignon, em 2008. Mas, nesses, os formatos foram realmente moldados a partir dos seios de uma rainha mais recente, a modelo Kate Moss.

 

Não reclame se a coluna estiver picante demais por conta dos copos e seus modelos. Afinal, a própria Jacqueline Kennedy lacrou o assunto com seu diagnóstico: “as coupes, não são só elegantes, são também sexies”, como lembrou a jornalista Amy Lazzarito, para a revista Food 52. Ele foi ainda mais além, ao confirmar o dito da eterna primeira dama americana em cenas dos anos 50, com personagens como Marilyn Monroe e, bem mais a propósito, Sophia Loren.

 

Voltando a falar sério, outra vantagem dos copos de vinho para os espumantes, além da concentração de aromas, é a respirada maior que a bebida ganha. E que quebra defeitos como a acidez excessiva, no caso de rótulos menos nobres. Tendo os dois copos na mão, sirva o espumante e faça os dois testes que sugeri aqui. Primeiro, o teste do nariz, começando pelo copo de corpo fino. E sinta a diferença para os sentidos no copo largo. Depois, faça o teste do paladar. Depois de uns dois minutos, prove começando novamente com a flute e depois passe para o copo de vinho. A tendência é de termos um espumante mais macio e até mais elegante na boca.

 

Mas calma, não precisa jogar seus antigos copos na parede. Pelo contrário, guarde-os, já que somente eles dão a pompa e a circunstância necessárias para alguma cerimônia especial, como o próprio brinde de fim de ano que teremos amanhã. E serão sempre a melhor escolha para quem aprecia o espetáculo do perlage, com as bolhas subindo com a graça de um colar de pérolas e a riqueza de uma queima de fogos de um ano novo que será ainda mais feliz de copo novo.

 

 


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