Não há dono de restaurante que não encha o peito de orgulho e diga, com uma oitava a mais no tom de voz: “o Boni esteve aqui”. Alguns vão mais além e tomam posse: “o Boni vive aqui”. E todos eles estarão dando a sua pitada de tempero a uma verdade na vida de José Bonifácio de Oliveira Sobrinho: ele vive em restaurantes. “Eu almoço e janto fora, salvo quando eu mesmo cozinho em casa”, revelou em entrevista exclusiva.
Pioneiro da propaganda e maior executivo da história da televisão brasileira, transformou sua paixão pela boa mesa em uma referência mítica, da qual muitos se gabam, mas poucos compartilham de fato. Filho e neto de espanhóis, traçou a rota de seu paladar com especialidades como o cocido à madrilenha da avó ou com os vinhos ibéricos, que o pai importava. E com uma memória notável, que o permite se lembrar de pratos que provou nos arredores de Veneza, da safra de um vinho da época do pós-guerra ou do detalhe de uma receita, que reproduz para os amigos a arte que mais curte: cozinhar.
Quais as suas especialidades, quando assume o fogão?
Eu gosto de variar dependendo dos convidados. Para um grupo que chamamos de confraria, faço uma cozinha moderna e inventiva. Da casa são o pudim de alho-porró e ovos de codorna com caviar fresco e os raviólis de foie gras ao consomê de pato com trufas negras, quando é a estação. Costumamos fazer alguns pratos do Joel Robuchon e do Ferran Adrià. Entre os clássicos estão um confit de pato com pele crocante e um parmentier de rabo de boi desfiado ao barolo e agrião. Das coisas comuns, adoro massas. Em Angra pintam os espanhóis como a paella , o peixe no forno ao açafrão e o cocido à madrilenha. Não faltam massas e o tradicional churrasco aos sábados.
Em que momento essa paixão despertou?
Minha avó espanhola por parte de pai era uma cozinheira excepcional e do lado materno minha mãe também era craque na cozinha.
Os pratos mais fortes, que você encarava na infância?
Eu adoro uma boa dobradinha e encaro uma rabada, mas em casa as coisas eram um pouco mais elaboradas.
O que considera alta e baixa gastronomia?
Eu detesto rótulos e acho que quem sabe comer vai da mortadela ao caviar, desde que ambos sejam de primeira.
O que você não pede de jeito nenhum?
Eu adoro um rim de vitela, mas aqui no Brasil vêm todos com gosto de xixi. Aliás, não sei o que acontece com a vitela brasileira que é tão inferior as que se encontram nos Estados Unidos, França e Itália.
Qual o seu lado doce?
Adoro sorvetes e sobremesas que tenham sorvete. Prefiro sempre uma boa seleção de “sorbet” de frutas a um doce. Mas tenho que reconhecer que a pâtisserie francesa é irresistível.
Quais os vinhos que você nunca esqueceu, pra bem ou pra mal?
Nunca me lembro de coisas ruins. De coisas boas tenho o registro de um Cheval Blanc 1947, de um Mouton Rothschild 1945 e um Romanée Conti 1935. Dos brancos morro de amores pelos Cortons Charlemagne Leroy e Coche Dury e todos os vinhos do Domaine Leflaive.
Qual foi o primeiro vinho?
Meu avô espanhol importava vinhos e eu, naturalmente, comecei pelos espanhóis.
E o mais recente?
Mais recente impossível: ontem, (10 de abril), o meu amigo Uajdi Moreira trouxe um Clos Erasmus 2004 que provei com o Manoel Beato e caímos para trás de tão extraordinário que era o vinho.
Curte drinques em geral? Quais?
Não sou chegado a drinques. Às vezes, encaro uma caipirinha com cachaça Santa Rosa.
A bebida que evita?
Não suporto uísque.
Alguma surpresa, ultimamente, entre copos e decantadores?
Os copos gigantes da “Schotz” são bons e charmosos. Decanter cada dia aparece um novo. Mas prefiro os clássicos. É só ter o cuidado de não decantar todo e qualquer vinho, especialmente os velhos com muita antecedência e correr o risco de perdê-los.
Qual o seu top list dos restaurantes do Rio e de São Paulo?
No Rio, a Roberta Sudbrack, anos luz à frente. Depois, o Claude Troigros, o Antiquarius, o Satyricon e o Gero. Em São Paulo, o Mani, o Vecchio Torino, o Fasano, a Brasserie Jacquim, o 348 e o inesquecível polpettone do Jardim de Napoli. O Pomodori era um dos favoritos, mas com a saída do chef Jefinho irei atrás dele.
Quais as carnes imperdíveis de Buenos Aires?
Na cidade, em Palermo, o La Cabrera. São dois locais, mas o Cabrera Norte é melhor. No entanto, as melhores carnes estão na periferia e são o Los Talas de Entrerriano e El Tano.
Quais os seus preferidos nos Estados Unidos?
De New York, o Le Bernardin, o Per Se, o Esteatório Milos, as carnes do Wolfgang. A vista e a comida do Lyncoln e o clássico Il Mulino. A cantina da pesada é o Pepolino. Em São Francisco, em Napa, o French Laundry e o Meadowood. Chicago não é minha praia.
Em Paris e Londres, quais você ainda não foi, mas pretende ir?
Já bati todos. Em Paris prefiro os bistrôs mais simples, como o Ami Louis. A melhor quenelle de brochet (lúcio) de Paris é do Moissonier. Tem um chinês que adoro, que é o Chen. E não dispenso o vietnamita Tan Dhin.
Dos grandes restaurantes internacionais, qual você se arrependeu de ter ido?
Os três estrelas, com raras exceções, são formais e chatos. Alguns são realmente bons, especialmente os menores. Os grandes restaurantes desse tipo são impessoais e detestáveis.
E do mar, o que prefere e o que evita?
Do mar prefiro as sereias das praias do Rio. Mas não evito nada.
A pizza ideal (e de onde)?
Difícil. Mas fico com a tradicional do Jardim de Napoli.
A salada que o agrada (e de onde)?
Gosto muito da salada a quilo do Celeiro, aqui no Rio. Mas a frisée aux lardons, do Moissoinier, em Paris, e a grega do Milos, em Nova York, são imbatíveis.
A sua casa de carnes preferida no Brasil?
A minha casa. Com carnes da Argentina e Uruguai não conheço ninguém que faça melhor.
Qual o risoto ideal?
Taí uma coisa deliciosa. Mas destaco um risoto ao barolo, feito pelo Vecchio Torino.
O restaurante italiano…
O La Calandre, em Rubano, perto de Veneza, com o risoto de açafrão e linguiça em pó. E o Dal Pescatore, em Caneto com um escalope de foie gras com frutas da estação.
Qual restaurante japonês?
O nosso peixe, devido às águas quentes, é muito ruim. Mas o Jun Sakamoto e o Murakami (Kinoshita) fazem milagres. Lá fora, adoro o Sushi Yassuda e o Soto, em New York, e, o máximo, em Tóquio, o Hamadaya, o Esaki, o Araki. E a tempura do Kyoboshi.
Algum boteco que frequente, no Rio e em São Paulo?
Jobi, no Rio.
E o sanduíche definitivo?
O Ino em New York. E, em casa, um pão com a calabresa do Jardim de Napoli.
O que experimentou recentemente, pela primeira vez, e adorou?
O Eric Rippert, chefe do Le Bernardin, nos surpreende cada vez que vamos lá com coisas fantásticas e inesquecíveis.
Petisco assistindo à televisão.
Petisco sim, televisão não.
O que come sozinho, em casa, quando ninguém está olhando…?
Coisinhas naturais, barras orgânicas etc.
O que mais o irrita em coquetéis?
Sempre digo que é bebida quente e gente fria.
Da recente onda de filmes sobre gastronomia, indica algum?
Os velhos, como “A festa de Babette”, eram tão bons que fica difícil.
Todos os donos de restaurantes garantem: “o Boni vive aqui”. Até que ponto isso é verdade?
Bom. Almoço e janto fora, salvo quando eu mesmo cozinho em casa. Portanto, é licito dizer que vivo em restaurantes.
O que o seu médico acha de tudo isso?
Os meus médicos são sempre meus melhores convidados e os que mais apreciam vinho e comida.
- 348
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Pedrão, muito interessante a entrevista. E cheia de dicas para aproveitar.
Abs.
O Boni falou do Chef Jefinho, que agora está no Attimo, num conceito ítalo-caipira. É na parte caipira que aparecemos. O Mestre Queijeiro Bruno Cabral apresentou o Queijo d’Alagoa/MG para o Jefinho que ficou encantado. Desde então, nunca falta nosso queijo lá no Atimo!