As chefs Adriana Mattar e Ana Cecília Gros são sócias. Mas mesmo com toda a convivência cotidiana no comando de reuniões, brainstormings e eventos de sua empresa, o Cooking Buffet, eles têm dois encontros bem marcados durante o ano. Em ambos, uma única pauta: viagem e muita gastronomia. Um desses encontros acontece em janeiro, em torno do Madrid Fusion, na busca pelas tendências que marcam os serviços que preparam. O outro encontro acontece sempre no verão, entre fins de junho e início de agosto, em roteiros mais diversos, mas que sempre têm uma escala em comum: a imbatível gastronomia de Paris, com o roteiro dos restaurantes estrelados e o circuitos dos bistronomiques. Nesta última temporada do verão europeu, brilhava o Noma, em Copenhagen, eleito pela terceira vez o melhor restaurante do mundo pelos jurados de uma revista inglesa, a Restaurant. Mas melhor do que escrever sobre um restaurante é contar sobre ele. É o que as duas fizeram aqui, com direito a um olhar bem feminino sobre todo o processo, da chegada à saída.
“Chegamos ao Noma antes da hora marcada. Era o ponto final de um roteiro de ansiedades que começou no Rio, ao fazer a reserva. Pedimos todos os tipos de confirmações, mas nos acalmaram – estava tudo certo. Nas duas vésperas, voltei a ligar e ofereci garantias, como cartões de crédito e números de passaporte. Serenamente, voltaram a nos tranquilizar, em bom inglês – todos falam inglês em Copenhagen. Mas não era só a dificuldade de se conseguir reserva que nos afligia. O problema maior é que nesses restaurantes é muito difícil conseguir uma reserva para menos de três pessoas. Éramos duas.
Antes do relato, uma dica: não marquem viagem para Estocolmo (também estivemos lá) ou Copenhagen durante a festa do solistício de inverno, que acontece em julho, pois vários restaurantes fecham. É feriadão. O próprio Noma merece uma atenção especial nesse caso, pois ele também passa uma temporada fechado. Conclusão: vamos ter de voltar à cidade. Mas a época também traz uma compensação: o próprio sol justifica o espetáculo e se põe à meia-noite. E renasce às 2h da manhã.
No Noma, o cardápio conhecido como Grand Tour dura 5 horas. Os cozinheiros, que chegam ao restaurante de bicicleta, lavam os pratos e servem as mesas. Não há jogo americano: é prato sobre a madeira. E o mais surpreendente: apesar da fama do restaurante, o ambiente é descontraído. Na mesa em frente, um grupo de gourmets degustava seus pratos em camisetas, bermudas e sandálias. O maitre te trata da mesma forma.
Com o serviço iniciado, toda a harmonização foi feita com champanhes de pequenos produtores. Nota-se uma presença marcante de alimentos na brasa, que deixam os sabores originais bem marcados, pois todos são muito frescos, do mesmo dia. E os pratos vieram com a marca da criatividade que marcou a casa: jarra com tempurá de maçãs, tapioca com shoyu e sashimi, batata maltada, escargots com flor de sal servidos em cestas de pão, ovo frito de pato, feito na sua frente, em panelinha de chapa de ferro fundido e servido com ervas sobre um ninho (!) e com despertador (!!).
Uma das coisas que marcam o serviço nórdico é a eficiência. Uma pessoa faz o trabalho de outras quatro sem alterar o sorriso. Nos café do Museu de Arte Moderna de Estocolmo, um único rapaz cuidava de todo o salão. E ainda tinha tranquilidade para tirar um cappuccino com espuma especial como poucas vezes nós vimos. Mesmo assim, no Noma, contamos 50 pessoas para atender a 33 clientes. É uma personalização como nunca vi. Um dos chefes principais, preparou a sobremesa na nossa frente.
Uma dessas sobremesas era a ‘pavlova’, um preparado à base de merengues e frutas, que se tornou tão popular em toda a Europa quanto o petit-gâteau tornou-se aqui. Tivemos ainda nosso algodão doce, nossa framboesa liofilizada e um fruitleather, que é uma espécie de couro que fazem com frutas e aglutinantes.
No fim, ainda pudemos sair do restaurante de barco.”
Excelente matéria.